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Essa tal felicidade

A morte, mais do que a vida, é uma grande contadora de histórias. Sabem como Alexandre, O Grande morreu?

Por Manoel Carlos
Atualizado em 1 abr 2018, 08h00 - Publicado em 1 abr 2018, 08h00
 (Leo Martins/Veja Rio)
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Quanto tempo perdemos à procura de uma grande história, até nos darmos conta de que não apenas as grandes, mas também as pequenas já foram encontradas, usadas e descartadas. E, a partir daí, o mérito será daquele que melhor souber reciclá-las. Nessas noites maldormidas, atormentados com alguma coisa que queremos contar, transpor para o papel, nem sempre as palavras nos acodem. E, nessa busca inútil, deixamos de ver o que está diante dos nossos olhos. E, se nos perguntam como vamos indo, devemos responder:

— Reciclando, reciclando.

Que é o que sempre fazemos.

É sabido que a vida nos traz poderosos ensinamentos, desses que carregamos pelo resto da existência e que sempre procuramos transmitir aos nossos filhos. E nessas ocasiões, em que a reunião familiar impõe diálogos um tanto quanto didáticos, com lascas de doutrina e amplos bocejos, o pai tem sempre na ponta da língua a frase lapidar e enganosa: “Eu sei como é, já tive a sua idade, já pensei como você”. E enche o peito para afirmar (pobre homem!) que conhece a essência humana.

Sim, a vida ensina, mas a morte sempre me pareceu levar mais a sério o exercício  — digamos assim — desse magistério imponderável, no ato de transmitir experiências. Acredito que contar aos filhos como as pessoas morreram é mais proveitoso do que saber como elas viveram.

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Vejam o caso de Alexandre, o Grande, que conquistou o mundo e passou à posteridade como o comandante militar mais poderoso da história. Sabem como ele morreu? Da picada de um mosquito! Isso mais de 300 anos antes de Cristo.

— Mas como, pai? Antes de Cristo já existia mosquito?

Essa pergunta é possível. Muitos acreditam que o mundo começou com o cristianismo!

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Meus possíveis leitores devem estar pensando que eu hoje estou um cronista da autoajuda ou da cultura inútil. Nem uma coisa nem outra. Apenas estava folheando um livro de nome muito sugestivo, Assim Morreram os Ricos e Famosos, e me caiu sob os olhos esse episódio da morte de Alexandre, me pondo a pensar que o mundo não precisa da nossa imaginação. O que é verdadeiro sempre será mais rico do que o que somos capazes de inventar. E que a Morte, mais do que a Vida, é uma grande contadora de histórias.

O escritor francês Albert Camus escreveu: “Todos os grandes feitos e as grandes reflexões têm origem ridícula. Grandes obras, com frequência, nascem numa esquina de rua ou na porta giratória de um restaurante”. E que até um mísero mosquito pode derrotar Alexandre, o Grande, reduzindo o esplendor de sua vida. Que nem sempre os maiores temas estão na cabeça dos maiores poetas. Os menores muitas vezes chegam antes e descobrem
que a Felicidade é a grande atração no espetáculo da nossa vida. Um cético nos perguntará: “Mas essa tal Felicidade existe?”.

Se essa pergunta for feita, como resposta poderemos citar três versos do poeta Vicente de Carvalho:

Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.

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