Uma amiga, a quem vou dar o nome de Isabel, está vivendo um drama familiar, pequeno ainda, mas que pode caminhar para um desfecho imprevisível.
— Juro que não há o mais tênue sinal de preconceito na minha objeção a esse namoro.
— Tenho certeza disso, Bel. Você tem a cabeça aberta. E o Fábio também.
Fábio é o marido da Bel. Ela torceu o nariz sutilmente:
— Obrigada pela “cabeça aberta”. Faço um grande esforço para manter acesa essa tênue chama de juventude que me restou. Quanto ao Fábio, você sabe, homem é homem, morre mas não perde a pose. E por isso mesmo não se conforma com o que está acontecendo. Balançou e perdeu o rumo. Uma hora quer comprar uma arma e matar todo mundo. Outra hora chora, esmurra as paredes, diz que vai saltar da Ponte Rio-Niterói…
— Posso imaginar…
Ficamos pensativos por um pequeno tempo… Ela percebeu que eu não tinha o que dizer. Afinal, trata-se de um assunto delicado.
Vocês, leitores, devem estar querendo saber a razão dessa história. Eu conto. O problema que vem amargurando meus amigos tem nome: Flávia, filha única do casal, que vai completar 18 anos.
— E…?
— Flavinha se apaixonou por um rapaz que está preso, Kiko…
— Kiko?
— Esse rapaz que participou de um assalto no Museu de Arte alguns anos atrás.
— Já sei, já sei — e lembrei do caso —, saiu até no Jornal Nacional.
— Esse mesmo — confirmou ela. — Foi condenado, está preso.
— Mas como é que ela se apaixonou por um presidiário?
— Ela está fazendo estágio na redação de um jornal. Quer porque quer ser jornalista. Pois bem: lá no jornal pediram uma pesquisa sobre jovens encarcerados e ela foi escolhida para tocar esse trabalho.
— E aí, claro, a proximidade…
— Insegura como ela é, o rapaz é bonitão, fama de Robin Hood, deve ter uma boa conversa, foi sopa no mel. Estou aflita, ela quer levar o rapaz lá em casa… e não sei o que pode acontecer…
— Mas ele não está condenado, preso, atrás das grades?
— Mas vai sair. Foi beneficiado por uma lei — não sei o nome.
— Progressão de pena?
— Não sei se é isso, mas pode ser.
— Caramba, Bel, que situação. Se eu puder ajudar em alguma coisa…
— Talvez possa. Você escreve para a TV, faz novela… inventa aquelas histórias mirabolantes… Quem sabe pode vir aqui em casa…
Dei mil razões para não ir, mas ela foi irredutível, encantadoramente irredutível, e eu fiquei de pensar. Voltou na semana seguinte.
— Preciso mesmo da sua ajuda. O aniversário dela é daqui a dez dias. Dezoito anos! Vai receber alguns amigos lá em casa e quer que o Kiko jante entre nós.
E vi quando os olhos dela lacrimejaram.
Não sou de resistir a lágrimas de mulher. Resolvi que vou ao jantar e depois conto a vocês o que aconteceu. Como sou novelista de TV, faço esta crônica em dois capítulos.
Aguardem o próximo.