Não esperava que a crônica anterior despertasse tanto interesse. Modesto, é claro, ante o interesse que despertam os grandes cronistas, mas, de qualquer modo, além do costumeiro.
Caramba, eu escrevi sobre Deus (que pretensão a minha!) e sobre a Graça de aceitá-lo no meu coração. Afinal, um ano está morrendo, dando lugar a outro, que chega carregando todos os enigmas do que não é nascido. Deus não resolve tudo, deixa um bocado para nós. E é desse bocado que devemos tirar proveito para nos aproximarmos d’Ele. É desse bocado que vamos tirar as porções que distribuiremos aos que têm menos do que nós.
Entre os que entenderam a motivação que me guiou e os que passaram ao largo desse entendimento, uma mensagem me chamou a atenção: a de uma leitora que escreveu
“Senhor Manoel Carlos, acabo de ler a revista VEJA RIO, fiquei consternada ao saber que o senhor é ateu. Pois lhe digo com toda a certeza que Deus existe…”.
Pensei: como pode alguém — homem ou mulher, seja de que idade for — entender exatamente o oposto da minha intenção, que foi declarar, de maneira transparente, incontestável, a minha fé na existência divina? O que eu gostaria mesmo era ser lido
e alcançado por aqueles que entendem que toda moeda tem verso e reverso, cara e coroa. E que uma não tem mais valor de compra do que a outra. O mesmo se dá com a virtude humana: uma pessoa pode ser boa e má ao mesmo tempo.
Minha cara leitora: abandone a consternação por me achar ateu. Repito que, ao contrário disso, sou um homem de fé, mas que necessita se converter a cada dia. Não acredito em perdas absolutas, sem retorno. Nem em lucro sem fim. Nunca fui ateu, apenas vivi períodos de pouca fé. E naufragava no rio quando Deus me pedia para caminhar sobre as águas. Tenho uma vida vivida que me faz assim oscilante. Mas deixo mais uma questão que atormentava o mesmo Camus: “Um homem pode tornar-se santo sem Deus?”.
Se dentro de nós não houver espaço para uma renovação, que se renove então a Esperança.