Tive um amigo que o que mais amava na vida era ser amado. Nas festinhas da adolescência, nas festonas de adultos, nos batizados e bodas, nos velórios (por que não?), ou em qualquer outra reunião que juntasse meia dúzia de pessoas, ele comparecia e… brilhava! Não conversava, exibia-se. Não falava como qualquer um de nós, discursava, declamava, como um ator sobre um palco, fosse qual fosse a plateia.
Não fazia distinção. Rapidamente tomava conta do espaço disponível, e a partir daí ninguém mais falava, todos ouviam. E, com desassombro, certa vez subiu numa cadeira, para que todos o vissem melhor, enquanto dava seu show.
Não era um chato, como alguns leitores podem estar pensando. Não. Mesmo quando exibia certa arrogância, era com graça impetuosa, riqueza nos gestos, nos trejeitos, na maneira como ilustrava suas conversas.
Era mestre em afirmar ou negar, com segurança, qualquer fato que estivesse narrando, assim como em sacar com rapidez citações ousadas, para garantir credibilidade à história, além de testemunhos que soavam como documentos reconhecidos em cartório, que assinaríamos embaixo.
— Está aqui o Duda que não me deixa mentir.
E víamos, pela expressão do rosto, que o Duda não sabia do que ele estava falando e que por isso ele podia mentir à vontade.
Outra vez falou:
— Claro que é verdade. O Aníbal estava na festa, ouviu quando falaram…
E, antes que terminasse, o Aníbal disse:
— Eu estava na festa, mas não me lembro disso, não.
— Ah, não se lembra porque ficou o tempo todo grudado no barril de chope!
Horácio era o nome dele. Como o filósofo, o grande orador, e um dos maiores poetas da Roma antiga.
— Meu pai dizia que o meu nome era uma homenagem ao grande poeta, que brilhou muito antes de Cristo. Nunca acreditei nisso.
E, piscando um olho, com malícia:
— Para mim, essa história esconde um caso de amor da Antiguidade, e do qual eu sou descendente. Modestamente, é claro.
As pessoas riam. Obviamente não acreditavam, mas saboreavam a verve daquele jovem inteligente que se divertia com elegância.
— Não são mentiras — diziam alguns. — É apenas diversão.
É como ir ao cinema, ao teatro…
E havia também, é claro, uns poucos, pouquíssimos, que o achavam cansativo, pretensioso além da medida… e que por isso fugiam da sala para não ouvi-lo.
— Tão novinho e tão inteligente!
— Como pode caber tanto conhecimento nessa cabecinha?
— Devia fazer palestras.
E muito mais.
Horácio morreu na quarta-feira passada, em São Paulo. Não fui ao enterro porque soube apenas dois dias depois. Mas amigos comuns me contaram que Horácio se manteve lúcido e esperto até o fim. Suas últimas palavras:
— Gostaria de morrer em praça pública, mas parece que não vai dar. Adeus para quem fica.