Manual de Sobrevivência no século XXI

Por Analice Gigliotti, Elizabeth Carneiro e Sabrina Presman Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Psiquiatria
Continua após publicidade

As lições na desistência de Simone Biles e na vitória de Ítalo Ferreira

A americana reconheceu a necessidade de parar e o brasileiro soube se divertir

Por Analice Gigliotti
Atualizado em 28 jul 2021, 17h28 - Publicado em 28 jul 2021, 15h18
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Goste ou não de esportes, a cada quatro anos paramos na frente da televisão para acompanhar a performance dos atletas brasileiros nos Jogos Olímpicos. As muitas vitórias em várias modalidades – vôlei, judô, natação, futebol feminino – sempre foram vistas como verdadeiros milagres da perseverança individual de cada atleta, já que o investimento oficial em modalidades esportivas no Brasil é pífio, ainda mais se comparado a outras grandes potências mundiais.

    Vida de atleta profissional de alta performance não é fácil. Disciplina, resiliência e dedicação são exigências inegociáveis. Mas além do preparo físico – como se fosse pouco! – é preciso ter inteligência emocional. Um ambiente regido essencialmente pela competitividade pode ser bastante desgastante para o cérebro. Ao sistema límbico, a parte emocional da nossa estrutura cerebral, é cobrado lidar com a frustração: é fundamental estar treinado para entender que a derrota é uma possibilidade – embora ninguém queira perder, claro. Queira ou não, a autoestima dos atletas é testada, como se dependesse exclusivamente da performance de poucos minutos, a cada quatro anos. Administrar uma atuação que não tenha sido no mínimo brilhante é muito pesado, ainda mais depois do rigoroso funil da seleção para se participar de uma Olimpíada.

    Essa condição atinge a todos: dos novatos aos mais experientes, dos azarões aos favoritos. E, quando ninguém esperava, pegou em cheio Simone Biles, a maior aposta americana na ginástica olímpica. Depois de uma avaliação médica, ela recebeu a recomendação de não competir: sua saúde mental estaria em risco. Biles, então, preferiu não tentar atender às gigantescas expectativas geradas em torno de si e se resguardar.

    A americana dá uma lição a todos nós: até que ponto você está se impondo a coisas que são pesadas demais para administrar? Em que aspectos da sua vida – profissional, pessoal, amorosa, familiar – estão exigindo mais energia do que você é capaz de dar? Desistir, portanto, não é um ato de fraqueza. Ao contrário, é demonstração de força. Se há sofrimento na execução de tarefas, algo está errado.

    E é aí que entra Ítalo Ferreira. Pouco antes de entrar no mar japonês pela primeira vez, o surfista confessou a uma repórter seu nervosismo, mas que “depois que entrou no mar resolveu se divertir”. Ítalo pode até não ter se dado conta, mas sua fala carrega uma mensagem comovente e empolgante. No fundo, é isso: divirta-se fazendo o que ama e o resultado acaba se tornando uma consequência natural do processo. No caso de Ítalo, a diversão se concretizou em uma medalha de ouro na primeira vez em que o surfe participou da Olimpíada. Foi justamente essa capacidade de se divertir apontada por Ítalo que Simone Biles parece ter perdido.

    Continua após a publicidade

    Os Jogos Olímpicos reforçam a ideia de que atletas são preparados para performances sobre-humanas. Porém, a postura de Simone Biles e Ítalo Ferreira nos lembram nossa dimensão absolutamente humana, entre fragilidades e virtudes. E mais: o quanto essa dualidade é absolutamente normal.

    Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da Escola Médica de Pós-Graduação da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.

     

    Publicidade

    Publicidade

    Essa é uma matéria fechada para assinantes.
    Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    Impressa + Digital no App
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital no App

    Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

    Assinando Veja você recebe mensalmente Veja Rio* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
    *Para assinantes da cidade de Rio de Janeiro

    a partir de 35,60/mês

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.