Educação e desenvolvimento são indissociáveis. Parece uma afirmação óbvia, mas infelizmente não é. Existem países que não se interessam por educar o melhor possível suas crianças e jovens, porque não entendem que o conhecimento qualifica o povo de uma nação para contribuir para seu progresso. No Brasil, nas gestões dos três últimos ministros da educação assistimos a um desmonte sistemático da educação pública. Uma lástima para nossas crianças e uma tragédia para o país.
Não serei mais um a falar de ENEM (a prova em que os aprendizes concorrem a um lugar numa universidade, o que é seriíssimo), mas serei mais uma pessoa indignada com o tratamento dado à educação das crianças e jovens brasileiros.
As escolas de educação básica, assim como a educação universitária, ao invés de serem objeto de preocupação para melhorias tendo a excelência como meta, tornaram-se uma obsessão do governo que enxerga ‘ideologia’ em qualquer pensamento mais complexo. É um governo que admira a ignorância sobre o conhecimento, a superstição sobre a ciência, que acredita que a Terra é plana, que despreza o saber e a cultura.
Num país em que milhões de pessoas estão em situação de fome, com mais de 14 milhões de desempregados, com mais de 600 mil mortes de pessoas com a Covid-19, perde-se tempo com o modelo de perguntas feitas no ENEM, perguntas elaboradas por funcionários concursados, experientes, que entendem de educação, que estudaram para isso, sempre dedicados a melhorar e tornar mais justa a prova. Nos últimos três anos acompanhamos a derrocada do sistema educacional brasileiro, entregue a ministros despreparados e incultos, o que não alvitra nada de bom para o futuro do país.
Todas as crianças devem receber educação básica de qualidade, sem nenhuma discriminação, seja de classe, religião, etnia, raça, gênero ou qualquer minoria e necessidade especial. Todas precisam estar aptas para enfrentar os desafios cotidianos e aproveitar as oportunidades econômicas e de aprendizagem pela vida afora. As nações em desenvolvimento costumam se esforçar para que as novas gerações tenham acesso fácil e o melhor possível ao desenvolvimento de suas capacidades para que possam não apenas aprender ao longo da vida, mas contribuir para a prosperidade da nação.
A educação é um direito humano e estrutura outros resultados de desenvolvimento sustentável de um país, como a superação da pobreza, a aceleração do desenvolvimento econômico, a produção de conhecimento e a pesquisa de ponta. Estabilidade, estrutura e esperança no futuro são dadas pela educação, que ajuda crianças e jovens a superar traumas e dificuldades da vida. Um ambiente de aprendizagem seguro torna as crianças e jovens menos vulneráveis à exploração e recrutamento por grupos do crime organizado.
Um estudo divulgado pela UNICEF em abril de 2021 – “Cenário da Exclusão Escolar no Brasil” – revela que a pandemia trouxe o risco de regredirmos duas décadas. Em novembro de 2020, com as escolas fechadas por causa da Covid-19, quase 1,5 milhão de crianças e adolescentes de 6 a 17 anos não frequentavam a escola (remota ou presencialmente).
Adicione-se a eles mais 3,7 milhões que estavam matriculados, mas não tiveram acesso a atividades escolares e não conseguiram aprender em casa. No total, eram mais de 5 milhões de crianças sem direito à educação em novembro de 2020. A exclusão atingiu principalmente crianças de idades em que a presença na escola não era mais um problema no Brasil pois, antes da pandemia, praticamente não havia mais crianças entre 6 e 10 anos sem acesso à educação.
Agora o país corre o risco de regredir duas décadas. Uma matéria da revista Veja, em 2015, divulgava que uma em cada cinco crianças não conseguia ler uma frase inteira ao fim do terceiro ano do Ensino Fundamental, quando deveriam estar plenamente alfabetizadas. É um dado preocupante porque de lá para cá o cenário piorou, ainda mais com a pandemia, e se aguarda um forte impacto em toda uma geração.
É urgente ir atrás de cada criança e cada adolescente fora da escola e garantir acesso à internet para todos. A escolarização contribui para a melhoria das possibilidades de trabalho e renda, prevenção de doenças, superação de desigualdades sociais e econômicas e determina as perspectivas das gerações futuras, especialmente nos países em desenvolvimento.
A formação dos professores é um elemento fundamental na educação de um país. Para assegurar um sistema de educação consistente, com crianças e jovens obtendo um ciclo completo de 10 anos de educação básica de qualidade, é preciso capacitar funcionários e agentes de educação do governo, apoiar institutos de formação de professores para criar um quadro profissional credenciado, melhorar o desenvolvimento e distribuição de materiais de aprendizagem e construir currículos relevantes; é preciso também prover as escolas de todas as necessidades de água, saneamento, higiene e segurança.
Educar um país traz enormes benefícios porque reduz a pobreza, impulsiona o crescimento econômico e aumenta o PIB, além de reduzir a taxa de mortalidade infantil e aumentar a expectativa de vida. É um dos investimentos mais importantes e que dão mais retorno a um país. Talvez o melhor de todos os investimentos.
No entanto, uma combinação de desprezo pelo conhecimento, desapreço pela cultura, rejeição à ciência, indiferença diante da pobreza, falta de vontade política, ou melhor, vontade política de desmanchar tudo o que se refere a uma educação de qualidade, ministros sem preparo e suas administrações aviltam os recursos humanos e materiais, o que atinge as novas gerações e as exclui de possibilidades de crescimento pessoal e profissional. Os reflexos serão sentidos em poucos anos, com uma geração despreparada para o novo mundo.
As sociedades precisam adaptar seus sistemas educacionais públicos para garantir o acesso de todas as crianças e jovens a programas educacionais que lhes garantam mais oportunidades de serem bem-sucedidos em suas vidas e de terem um futuro melhor. O desenvolvimento de um país se constrói com uma educação que faça refletir e pensar, e que incentive o pensamento crítico, inovador e ético.