Quando eles anunciaram o retorno – ainda que temporário –, eu sabia que não poderia perder aquele encontro. O show do Titãs, realizado na Arena Jockey no último fim de semana, foi simplesmente arrebatador. Com um cenário deslumbrante e um set list de tirar o fôlego, é uma mistura de catarse, saudosismo, explosão, reunindo diferentes gerações e um conjunto de vozes que dá a dimensão do que o Titãs se tornou na história da música brasileira: titãs.
Revisitando o repertório de uma carreira de mais de 40 anos, nesse reencontro – a turnê Titãs Reencontro, Pra Dizer Adeus – a banda está toda lá, exceto pela ausência de Marcelo Fromer, que se foi em 2001, vítima de atropelamento, na cidade de São Paulo. Mas sua filha Alice o representa muito lindamente, em homenagem que a banda faz ao guitarrista, em uma participação muito emocionante. As imagens no telão vão revezando momentos dele em família, com a filha e com os companheiros.
Arnaldo Antunes, Nando Reis, Charles Gavin, Paulo Miklos, Branco Mello, Sergio Britto e Tony Bellotto, todo mundo junto e se divertindo horrores, como fez questão de anunciar Miklos. “Vocês estão se divertindo aí, mas nós estamos nos divertindo muito mais aqui”, disse o cantor. E ainda tinha o produtor Liminha, responsável por tantos discos da banda e que assumiu ali o lugar de Fromer na guitarra. Ou seja, um ajuntamento e tanto de estrelas do rock nacional para fazer nossos corações pulsarem a muitos bpm.
Dava vontade de chorar, de cantar (na verdade, gritar), de dançar e de lembrar que um dia fomos tão, mas tão jovens! Por aquelas duas horas, éramos os mesmos rapazes e moças de 1980. O público, na maioria a minha geração – que é a mesma dos Titãs –, se jogou em versos como os de Bichos Escrotos (1986, disco Cabeça Dinossauro), em que extravasávamos toda a nossa raiva de uma ditadura que ainda rondava por ali. Tudo tão atual, as letras, os bichos. Os Titãs foram visionários de um futuro que viria no século 21, sendo ali presente, mas que também já havia sido passado nesse país chamado Brasil, ao cantarem os bichos escrotos que permeiam nossa história (assim com h minúsculo mesmo) e que sempre estiveram por aí.
As canções vão passando e a viagem é inteira, intensa. Os discos ‘Cabeça Dinossauro’ (1986), ‘Jesus não tem dentes no país dos banguelas’ (1987) e a formação do Acústico MTV (1997), que revisita os anteriores, compõem a maioria do setlist. Ver Branco Mello mostrando toda a sua potência, recuperado de um câncer na laringe, mas ainda sem poder fazer o show inteiro, cantando Cabeça Dinossauro, do disco homônimo, é de deixar sem fôlego. Logo depois vêm os acordes de Epitáfio, de Sergio Brito (disco “A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana” – 2001), e a gente ali gritando “o acaso vai me proteger, enquanto eu andar distraído”, e toda uma sequência de hits lembrando o disco acústico gravado para a MTV, quando a banda completou 15 anos. O show é um deslizar de todos os hits da banda, sejam as baladas ou o punk hardcore, como em Polícia (cujo refrão todo mundo grita a plenos pulmões). Flores, Homem Primata, Palavras, Família, A Melhor Forma, todas as músicas que a gente sonha ouvir estão lá.
Arena Jockey
Destaque para o local e a estrutura dos shows, a Arena Jockey, que tem sido uma experiência incrível. Chamo a atenção para isso porque o cuidado com os serviços acaba afetando a vivência de quem vai a um show ou a um festival, e seja a lama, os banheiros inadequados ou as filas fazem cair tudo por terra, mesmo sendo um incrível. Lembrem-se do desastre que foi o festival Uma Doce Maravilha, na Marina da Glória. Mas é não só, tem ainda os aspectos de segurança e de organização, que nesse último fim de semana chamaram tanto a nossa atenção. O desmoronamento do palco nos 450 anos de Niterói durante a apresentação do DJ MAM e a falta de organização e de gestão de riscos no primeiro dia de show da Taylor Swift, que levou à morte da universitária Ana Clara Benevides Machado, são acontecimentos que indicam que cada vez mais os realizadores de eventos não podem se descuidar dos aspectos primordiais de segurança e de conforto do público. E esses realizares se multiplicaram de forma exponencial depois da pandemia.
Com diferentes formatos, tenda climatizada e uma área de gastronomia com cobertura, a Arena Jockey tem tido um cuidado extra com o conforto e uma programação incrível, de quinta a domingo, com shows, roda de samba, DJs e um polo gastronômico . Tudo ali funciona bem, desde a lotação adequada para que o evento fique confortável (e cheio, é claro), até as filas, o ar condicionado, os banheiros e os serviços gerais.
A roda de samba com Pretinho da Serrinha é um programa à parte, com as surpresas que chegam a cada quinta-feira para dar canja no palco que reúne as pessoas tão pertinho dos artistas. No dia em que eu estive por lá, foram participações de Maria Rita e Marisa Monte. Mas já passaram por lá Moacyr Luz, Martinália, Xande de Pilares, Sandra de Sá e muito mais. O horário da roda e dos shows é outro destaque, pois tudo começa e acaba cedo, não passando de 22h os shows e de meia noite a extensão de pista com DJs e gastronomia.
Na programação, ainda muita coisa boa por vir, como Ney Matogrosso, Marisa Monte e Marisa Bethânia, só para citar alguns. E quem ainda quiser ver o reencontro dos Titãs aqui no Rio, mais uma e última oportunidade no Qualistage, na próxima quarta (21). Eu só posso dizer a você que ainda não foi: vá!! É experiência e memória para toda uma vida.
Rita Fernandes é jornalista, escritora, presidente da Sebastiana e pesquisadora de cultura e carnaval.