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Daniel Drexler, ou o pop sem fronteiras que vem do Sul

  O Oscar de melhor canção (como autor de Al Outro Lado del Río, tema do filme Diários de Motocicleta, em 2005) fez um bem danado à carreira do músico uruguaio Jorge Drexler, 49 anos. Sem a evidência proporcionada pelo tapete vermelho, seu irmão Daniel Drexler, cinco anos mais novo, também formou-se em medicina (é […]

Por Pedro Tinoco Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 25 fev 2017, 18h56 - Publicado em 5 out 2013, 00h39
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  • Daniel Drexler em foto de Alvaro Muniz: primeiro show no Rio

    Daniel Drexler em foto de Alvaro Muniz: primeiro show no Rio

     

    O Oscar de melhor canção (como autor de Al Outro Lado del Río, tema do filme Diários de Motocicleta, em 2005) fez um bem danado à carreira do músico uruguaio Jorge Drexler, 49 anos. Sem a evidência proporcionada pelo tapete vermelho, seu irmão Daniel Drexler, cinco anos mais novo, também formou-se em medicina (é otorrinolaringologista) e também trocou o consultório pela música. Embalado pelo repertório do quinto disco, Mar Abierto, lançado este ano, Daniel se apresenta no Rio pela primeira vez, no Solar de Botafogo, na quinta (10), às 21h30. As doze faixas do novo trabalho podem ser definidas como um pop eletroacústico de letras levemente melancólicas, com arranjos que visitam da bossa nova (em Maestra) a gêneros de sua terra natal, a exemplo da milonga (em Cuando Estalla). Em resumo: é gostoso de ouvir e traz versos sem afetação, mas que dão o que pensar sobre questões da vida contemporânea.

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    O CD foi gravado em 2012, em sessões no Uruguai, na Argentina e em Porto Alegre, um circuito bastante frequentado pelo músico. Em meados dos anos 2000, inspirado pela cena que cultiva com nomes como sua conterrânea Ana Prada, Kevin Johansen (americano, de mãe argentina, que viveu infância e adolescência em Buenos Aires) e o gaúcho Vitor Ramil, Daniel criou, em tom de brincadeira com o tropicalismo, um movimento para reunir a turma: o templadismo, ou “temperadismo”, em português – uma alusão ao clima temperado do sul do continente, influência forte em sua obra. Lá embaixo, depois da instrutiva conversa com Daniel, assista a um vídeo bacana no qual o hermano do Jorge conta mais sobre seu trabalho e como é que funciona na prática essa história do templadismo. Não por acaso, a dupla Kleiton & Kledir, irmãos de Vitor Ramil, participa da apresentação carioca. A propósito: o novo álbum de Daniel Drexler é o primeiro disco estrangeiro a ganhar lançamento no Brasil através de crowdfunding, em edição de luxo, com tiragem limitada, realizada através do site Traga Seu Show.

    FALA DANIEL

    Em que o seu estilo musical e o do seu irmão se aproximam? E em que os trabalhos se diferenciam?
    Somos mais do que irmãos. Somos muito amigos e dividimos uma maneira de ver o mundo, uma mesma sensibilidade. Somos músicos com intenção antropofágica. Talvez a maior diferença, no momento, seja que meu trabalho ultimamente tomou um caminho mais regional, já que estou muito feliz de ter voltado a viver em Montevidéu e muito conectado com a bacia do Rio da Prata. Neste momento Jorge está mais em uma etapa cosmopolita, mas o curioso é que em outros instantes de nossas trajetórias os papéis foram quase inversos.

    Este é seu primeiro show no Rio. Já esteve na cidade antes? O que conhece de pessoas e lugares da cidade?
    Estive muitas vezes no Rio. Vou confessar que o Rio é a única cidade do mundo que me faz balançar em relação à minha decisão de viver em Montevidéu. Gosto das cidades com mar, como Montevidéu. O Rio também me fascina pela cultura, por ter sido desde sempre um farol com luz poderosa, em particular para nós, os músicos.

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    Que artistas brasileiros você admira? Já trabalhou com algum?
    A lista é grande. Tenho grande admiração pela cultura brasileira em geral. Na música, vou de Dorival Caymmi a Lenine, passando por Gil, Caetano, Djavan, Moska, Buarque, Ramil, Marisa Monte, Arnaldo Antunes, João Bosco, Villa-Lobos, Vinicius, Marcelo Camelo, Moreno, Domenico, Kassin,  Noel Rosa….Além, é claro, de João Gilberto e Tom Jobim. Tive a sorte de trabalhar com Vitor Ramil em um projeto com a Orquestra Fundarte de Porto Alegre. Vitor é uma grande referência para nós do sul.

    José Mujica, presidente do Uruguai, sempre dá o que falar. O que o senhor acha de suas mais recentes, e polêmicas, medidas, a exemplo da descriminalização do aborto e da maconha?

    Creio que se inscrevem na melhor tradição do Uruguai vanguardista do século XX. O Uruguai foi um dos primeiros países a separar a Igreja do Estado, a permitir o voto feminino e a instalar as oito horas de jornada laboral. Mujica não apenas descriminalizou o aborto e a maconha, ele também legalizou o matrimônio igualitário. Essas medidas, acho eu, nos levam a uma sociedade mais aberta, mais tolerante e menos hipócrita. Mujica me encanta como pensador e como exemplo ético. Sua capacidade executiva lamentavelmente não está à altura de seu pensamento.

    Quem são os músicos que o acompanham no show?
    Minha querida banda, com a qual venho tocando nos últimos dois anos, traz Dany López, produtor do disco Mar Abierto, nos teclados, Gonzalo Gutiérrez, que mixou e masterizou Mar Abierto e foi produtor dos meus primeiros discos, no baixo, Eduardo Mauris na guitarra e Javier Cardellino na bateria e na percussão.

    Ao vivo você também toca músicas alheias?
    Neste momento estou tocando apenas composições próprias. Já tenho cinco discos gravados e, na verdade, às vezes tenho que deixar canções que me encantaria tocar para não tornar o show muito longo. Em outros momentos já toquei canções de Atahualpa Yupanqui, Spinetta,  Anibal Sampayo, Caetano, Gil,  Jobim, Bob Marley, Los Beatles, Buarque, Fernando Cabrera, Osiris Rodriguez Castillos, Santiago Chalar, El sabalero, Peter Frampton….
     O conceito de Mar Abierto é o de uma viagem de barco. O quanto esse percurso pelas águas do disco o levou adiante, em relação a seus quatro discos anteriores? Melhor dizendo: musicalmente, que tipo de novas experiências você vivenciou neste novo trabalho?
    Saí a navegar sem uma rota concreta. Simplesmente parei diante da imensidão do horizonte e soltei as velas ao vento. Foi a primeira vez que gravei ao vivo dentro do estúdio. As bases de bateria, baixo, contrabaixo e piano foram, em uns 80%, gravadas juntas, ao mesmo tempo, em um estúdio de Buenos Aires, sem o apoio do metrônomo. Alguns takes de voz foram registrados de primeira. A ideia era recriar a estética sonora de Kind of Blue, o disco de Miles Davis. Nos últimos anos ganhamos muito com a digitalização da música, e da vida em geral, mas eu sentia que mais e mais me faltava voltar a sentir o calor de cinco músicos tocando simultaneamente, na mesma sala. O resto do disco foi gravado em uma viagem por terra entre Buenos Aires, Montevidéu e Porto Alegre. Gonzalo Gutiérrez fez mixagem e masterização em sua casa, porque confio muito em seu gosto e sua capacidade técnica, e porque o som era tão artesanal que eu não queria que ninguém mais pusesse as mãos naquilo.

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    Curiosidade: na faixa-título quem é o brasileiro que fala a frase “você pode sair da favela, mas a favela não sai de você”?
    É Richard Serraria, parceiro de Porto Alegre. Pedi a ele que gravasse algo relacionado com a frase “you can get the boy out of the ghetto, but you can’t get the ghetto out of the boy”. Essa frase eu a disse pensando no meu pai e em sua história de sobrevivente do holocausto. Na minha família e na minha história pessoal, o desafio foi sair do gueto. Na história pessoal do Richard, o desafio era sair da favela. Todos temos o desafio de sair de algum lado em algum momento de nossas vidas.

    O senhor é um frequentador da cena musical de Porto Alegre. Poderia citar músicos e palcos gaúchos que admira?
    Vitor Ramil, Kleiton & Kledir, Zelito, Delacroix, Richard Serraria, Pirisca Grecco, Arthur de Faria, Angelo Primon, Mario Falcão. Meu palco preferido é o Teatro São Pedro, onde apresentei meu disco anterior, Micromundo, e onde terei a honra de mostrar Mar Abierto.

     

    Daniel Drexler. Solar de Botafogo (180 lugares). Rua General Polidoro, 180, Botafogo, ☎ 2543-5411. Quinta (10), 21h30. R$ 50,00. Bilheteria: 16h/22h (seg. a qua.); a partir das 16h (qui). IC. https://www.solardebotafogo.com.br.

    [youtube https://www.youtube.com/watch?v=szGFZZyuNbc?feature=oembed&w=500&h=281%5D

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