Na última viagem que eu e meu marido fizemos a Paris tivemos a deliciosa companhia de um casal de amigos, o Caíca e a Cristina, em sua primeira visita à Cidade Luz. Lá, avisamos a eles que assim que pisassem de volta em solo carioca o primeiro amigo que encontrassem certamente perguntaria: “Foram a tal lugar? Não?! Caramba, então vocês não conheceram Paris”. Complementamos com um adendo gaiato: “Todo mundo conhece mil lugares imperdíveis em Paris e em várias cidades do mundo. Por isso, pra facilitar, mesmo se não tiverem ido digam que foram e a-do-ra-ram”.
Nunca viajo me sentindo na obrigação de ir aos pontos turísticos só porque todo mundo no mundo inteiro vai. Na minha humilde opinião, tudo bem ir a Roma e não ver o Papa, ir à Paris e não ver a Mona Lisa, ir à Natal e não andar de dromedário. Ah, sim. Eu descobri na minha ida à Natal que dromedários são uma atração e tanto por lá. Amo o Nordeste e este ano tive a possibilidade de conhecer a capital do Rio Grande do Norte e toda sua beleza por conta de um trabalho. Num dia de folga, propus ao meu acompanhante Wiled, amigo de todas as horas, um típico programa turístico: um passeio de buggy.
O motorista chegou empolgado avisando que seriam seis horas de passeio. Diante da nossa cara de espanto, ele justificou: conheceríamos sete praias e duas lagoas. Duas lagoas! Ok, bora turistar!
Depois de um engarrafamento quilométrico e suando bicas no banco de trás, eu e Wiled fomos apresentados à primeira praia: Genipabu. Ficamos impressionados. Era tudo muito: muito bonito, muito grandioso, muito arrebatador, muito quente, muitas dunas, muita gente, muito jegue. Opa! Jegue!
– Quem quer foto com jegue? Quem quer foto com jegue? – perguntava um menino de bermuda.
– Tire, moça. Jegue aqui é atração turística. E é baratinho. Agora, se montar no jegue é um pouquinho mais caro, viu? – explicou o motorista.
– Mas tem fila, moço – reclamou Wiled.
– Mas anda rapidinho, seu William.
Wiled/ William e eu recusamos prontamente, e olha que o menino de bermuda era insistente à beça. Nada contra os jegues, até gosto deles, mas eu e o Wil não somos o tipo de turistas que tira fotos a todo momento, ainda mais de atrações turísticas. Fotografamos a paisagem mesmo (que dava de mil nos jegues) e, para total surpresa do motorista, que parecia não acreditar na nossa recusa para a foto, pedimos para ele seguir com o passeio.
Chegamos à primeira lagoa, cujo nome não me recordo e onde era impossível achar um espaço vazio na praia que a circundava. Lagoa bonita, lagoa lotada, vimos, não caímos na água e chamamos o motorista dez minutos depois de chegar lá.
– Mas já? Era pra vocês ficarem pra base de uma horinha se refrescando aí. Ôxe, mas vocês não são fáceis…
Partimos para a segunda lagoa.
– Aqui vocês vão querer ficar. É a lagoa da tirolesa. Cai de bunda na água, o povo adora.
⎯ Mas a gente não tem mais idade pra isso, moço.
⎯ Como não? Isso aqui é atração turística!
Cada vez mais inconformado com nossa atitude turismo zero, o motorista nos levou a outra praia, mais outra, e nós, sem sair do carro, nos limitávamos a suspirar embevecidos com a paisagem e seguir em frente. Sem parar para fotos. Finalmente chegamos à praia onde estavam os famosos dromedários.
⎯ Daqui a uma meia horinha eu tô de volta e pego vocês. Porque agora é a vez dos dromedários e eu duvido, du-vi-do!, que vocês não queiram dar uma voltinha de dromedário. Porque du-vi-do que no Rio tenha dromedário dando sopa assim!
⎯ Não! A gente não quer andar de dromedário… Já vimos os dromedários, são fofos.
⎯ E desde quando dromedário é fofo, dona? Dromedário é um bicho raro, gente! Aproveita o dromedário, vai por mim!
⎯ Sem dromedário, querido… ⎯ decretou Wiled.
⎯ Mas estamos adorando o passeio, mesmo sem dromedário, viu? ⎯ disse, pra deixá-lo mais felizinho.
⎯ Então agora vocês vão almoçar? Tem um restaurante aqui perto onde todos os turistas almoçam e adoram.
Preferimos almoçar perto do hotel a nos arriscar a cair numa cilada turística sem corcova.
⎯ Então vamos voltar pra Natal… Fazer o quê? ⎯ suspirou o motorista, que não era dromedário mas era um fofo.
⎯ Mas já? E as seis horas de passeio? ⎯ questionou Wiled.
⎯ Ôxe, mas vocês não quiseram fazer nada, seu Wilem… A gente em duas horas já matou tudo.
No caminho de volta, ele passou por uma linda praia deserta, de água cristalina, cenário de filme. Quisemos parar para um mergulho.
⎯ Aqui? Mas justo aqui!? Aqui não tem nada demais! Ninguém para aqui! Nem comida pra vender tem! A senhora me desculpe, mas vocês são esquisitos, hein?
Rimos e nos jogamos na imensidão azul felizes como duas crianças, abestados com a beleza arrebatadora, com a natureza em estado bruto. E um silêncio celestial. Achamos sem querer o paraíso na Terra. Ele era nosso. Só nosso. E é assim que eu gosto de viajar: descobrindo lugares, experimentando sensações e comidas novas, me permitindo fazer o que ninguém faz, o que não está em nenhum guia turístico. Às vezes, sentar numa praça e ver a vida passar numa cidade que você visita pela primeira vez pode ser muito mais interessante e enriquecedor do que tirar mil fotos em lugares insuportavelmente lotados ou pegar uma fila gigante só para dizer que foi, sim, a tal lugar considerado imperdível pela maioria das pessoas.
No almoço, num restaurante simples de culinária impecável, que escolhemos aleatoriamente quando bateu a fome, pedimos várias entradas para beliscar. Perguntei ao garçom:
⎯ Essa lula à dorê aqui do cardápio… Ela é tipo incrível?
⎯ Não é não, é empanada.
Rolei de rir.
Como a lula era sensacional e fez muito bem às minhas papilas gustativas, mudei de hábito. Agora, quando quero dizer que algo é incrível, digo simplesmente que é empanado. Tipo empanado.
E assim, com idas despretensiosas a restaurantes mais despretensiosos ainda, viagens como essa se tornam inesquecíveis. Falando em inesquecível, Natal é tudo de bom e mais um pouco. É tipo empanado. E bota empanado nisso!