Larguei as botas na escada, subi descalça e pensei: sossega, coração. Estive de férias e, entre os jogos olímpicos e os passeios com a Lakshmi, reli Alice no País das Maravilhas, que é um dos meus refúgios. Também investiguei os neurônios das lagostas e como suas conquistas e derrotas são impressas no corpo, e comecei a assistir a um documentário da Lygia Clark sobre a memória do corpo. Tudo parece me levar às lagostas e até Alice. “No meu reino você precisa correr o mais rápido que puder apenas para ficar no mesmo lugar”, diz a Rainha de Copas.
Tenho recebido pessoas que se sentem angustiadas porque tudo está mudando, numa rapidez assustadora. No fundo, eu gostaria de compartilhar essa fala da rainha de copas, mas sinto que elas esperam algo em sânscrito, bem complexo, que não vão entender, para poderem se acalmar.
Para estar onde estamos e, de maneira iludida, tentamos preservar nossa posição, nossas relações, e sei lá o que, precisamos nos mexer.
Movimentar para poder desfrutar do mesmo lugar. Vivemos mergulhados na dualidade da ordem, masculino, e do caos feminino. Algumas coisas mudam rápido, sim, mas elas estão aninhadas dentro de outras que mudam menos rapidamente. E isso não deveria nos apavorar. É um fato que a mudança é. É a natureza. As folhas mudam mais rapidamente que as árvores. As árvores mais do que as florestas. O tempo muda mais rapidamente que o clima. É o caos dentro da ordem, dentro do caos, dentro de uma ordem maior.
De um ano para cá também tenho sido pautada por muitas mudanças e somente quando eu acolhi o fluxo, passei a confiar de maneira consciente na minha intuição. Não quero dizer que eu não confiava antes, mas agora existe uma consciência no ato de confiar, que me fortalece. E quando você se sente forte, você se acalma e você ama. A intuição alimenta a sua capacidade de amar.
É um baita exercício ser intuitivo. Você não decide. A intuição é um salto – não é algo que chegue até você por meio de passos. Ela é algo que acontece a você. Se não fosse súbita, nem completamente descontínua em relação ao que aconteceu anteriormente, então a razão descobriria o caminho. Ela é um salto do nada para o ser. É por isso que a razão a nega. A razão nega a intuição porque é incapaz de enfrentá-la. A razão só pode enfrentar fenômenos que possam ser divididos em causa e efeito.
Para dar espaço a intuição você precisa entender que ela não é o intelecto, ligado à cabeça, tampouco o instinto, que se conecta ao funcionamento do corpo. A intuição é o funcionamento do coração. O instinto é quase infalível porque ele é muito velho, muito maduro, muito experiente. O seus olhos estão piscando, o seu coração batendo, a sua respiração entra e sai. Não depende do intelecto cuidar de todas as funções essenciais na sua vida. Elas estão nas mãos do instinto porque ele é infalível – nunca se esquece de respirar, nunca esquece de nada. Sabe quando o cheiro de alguém te atravessa e abraça? É o instinto. 😉
Acho que o instinto é sempre justo e demonstra a maneira natural e relaxada que o universo flui. Instinto e intuição funcionam juntos perfeitamente bem – um no nível físico e outro no nível espiritual. “Todo o problema da humanidade está em ficar presa no meio, na mente, no intelecto. Então, você tem a ansiedade, a agonia, a falta de sentido, e todos os tipos de tensão. Com o instinto e a intuição funcionando juntos, você também pode usar o intelecto para as finalidades certas”, nos lembra o Osho, no livro Intuição.
A melhor maneira de ouvir a sua intuição é durante o processo meditativo. Nesse intervalo de tempo há um ambiente para você ficar mais confortável com quem você é, sem medo do seu inconsciente, que está sempre no silêncio. Nós precisamos aprender a confiar um pouco mais no natural. A pandemia despertou o interesse de muitas pessoas pela meditação. Em algum momento, todos nós experimentamos essa verdade do inconsciente. Ele é nove vezes mais poderoso que o consciente, não se importa com a sua lógica, com o seu raciocínio, com nada. O que quer que você decida com o seu consciente pode simplesmente ser jogado fora pelo inconsciente a qualquer momento.
Os conflitos externos sempre envolvem relações. Quando as pessoas me perguntam o que deveriam fazer para se aprofundar num relacionamento, digo que primeiro elas devem mergulhar na meditação. A menos que você esteja mais resolvido internamente, ou ao menos mais encaixado, você não vai ser capaz de amar em paz.
Por isso, meu coração sossega.
Hoje minha fala de amor é serena.