O limite da intervenção da tecnologia aceitável no vinho é muito pessoal, mas, a cada dia, mais e mais vinhos são manipulados e tendem a se parecer, especialmente nos rótulos de baixo custo. E uma destas tecnologias mais modernas é a osmose reversa, que tem gerado inúmeras polêmicas desde o seu surgimento.
Bons vinhos se fazem com boas uvas, ou seja, uvas equilibradas em seus componentes, como açúcar, acidez, cor, aroma e taninos. Para tal, é necessária uma maturação adequada, o que depende do clima, já que cada componente mencionado tem seu processo de amadurecimento ao longo da safra.
Em climas quentes, existe uma tendência do ponto ideal de concentração de açúcar e acidez ocorrer antes da maturação ideal de taninos, por exemplo. Daí para se ter um vinho com taninos maduros, quase sempre, teremos vinhos com baixa acidez e muito álcool. Já em climas frios, é quase o oposto. Para que a acidez e os açúcares atinjam o ideal é necessário esperar mais, sob o risco de expor as uvas às chuvas de outono, que diluiriam o vinho.
Atualmente, existe uma tecnologia chamada osmose reversa que torna possível remover álcool do vinho pronto ou concentrar o mosto antes da vinificação. Lembrando de nossas aulas na escola primária: osmose é o fluxo do solvente de uma solução pouco concentrada em direção a outra mais concentrada através de uma membrana semipermeável. No caso do mosto, o solvente é a água e, no caso do vinho pronto, além da água há o álcool. Submeter o mosto ou vinho a uma osmose normal seria diluí-lo, mas se esta osmose for ao contrário…
A osmose reversa é possível com o uso de uma máquina chamada Vinovation, criada no final dos anos 1980, na Califórnia, por Clark Smith, um engenheiro apelidado de Dr. Frankenwine, ou Belzebu em pessoa para os adeptos dos vinhos naturais. Outra brincadeira que ilustra o sentimento de alguns em relação a esta tecnologia é alcunhar a osmose reversa de osmose perversa.
A máquina do Dr. Frankenwine aumenta a pressão na solução mais concentrada, reverte o fluxo e tira água do mosto ou vinho, em um processo semelhante a espremer o mosto para retirar a água por um filtro. Esta mesma geringonça serve para tirar álcool do vinho pronto, em um processo mais radical. Neste caso, separa-se o álcool que vem junto com a água. Em uma etapa seguinte, a solução de água e álcool passa por uma destilação que separa a água do álcool e a recoloca no vinho.
Clark Smith já contou em várias entrevistas que sua criação está em centenas de vinícolas em diversos países, mas jamais revela o nome de seus clientes. Ele também garante que, na Califórnia, cerca de 45% dos vinhos premium sofrem algum tipo de redução de álcool. Ao que parece, esta tecnologia é uma arma poderosa e, como toda arma, pode ser usada para o bem ou para o mal.
Os que são a favor desta tecnologia argumentam que ela se assemelha a outros artifícios muito aceitos como, por exemplo, a chaptalização (adição de açúcar ao mosto para aumentar o teor alcoólico dos vinhos em safras diluídas) ou a sangria, processo que filtra uma parte do mosto sem as cascas das uvas separando-o de outra parte que concentra mais cascas – geralmente obtendo de um lado um vinho rosé e de outro um tinto com maior concentração de cor e corpo.
Alguns pontos são claros: a osmose reversa realmente funciona ao conseguir concentrar vinhos ou diminuir-lhes o teor de álcool e não causa nenhum mal à saúde de quem consumir tais vinhos. O que se debate hoje em todo o mundo não é a eficiência do processo, que já é uma realidade, mas o fato de ser ou não honesto fazê-lo, já que raramente se sabe qual vinho foi submetido a esta intervenção.
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