Adeus aos enochatos nos novos bares de vinho
Inaugurações recentes rejuvenescem o público da bebida, desconstroem antigas regras de etiqueta e revelam estilos pouco conhecidos

Já não se fazem mais bares de vinho como antigamente, e isso parece ótimo. Depois de algumas portas fechadas na pandemia — período em que o consumo de tintos e brancos cresceu no país, mas dentro de casa —, uma nova geração de estabelecimentos especializados na bebida vem atraindo um público rejuvenescido, curioso e de paladar aberto para estilos e métodos de produção vinícola distintos. São balcões e mesas que têm no foco a pureza e a qualidade do que é degustado, entre líquidos e sólidos, com as cozinhas nas mãos de chefs renomados como Roberta Ciasca, do Libô, e Monique Gabiatti, do Belisco. Caminhos empolgantes de harmonização são abertos, na maioria das vezes guiados por rótulos que sobrevoam o universo dos chamados “naturais”, feitos a partir do cultivo orgânico das uvas, da fermentação com leveduras indígenas e da ausência de aditivos químicos, em sintonia com tendências globais de consumo consciente.
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A fartura de opções servidas em taça é outra marca desses lugares onde o prazer de experimentar tornou-se regra, com opções em constante renovação, incluindo as bebidas alçadas a estrelas da nova era. É o caso do já famoso vinho laranja, apontado pela sommelière Maíra Freire, sócia de Roberta no Libô e também responsável pela carta do luxuoso Lasai, o duas-estrelas Michelin do chef Rafa Costa e Silva, como o mais querido da nova geração de consumidores. Trata-se de um estilo que segue tradição milenar, resgatado por produtores italianos na fronteira com a Eslovênia, antes de invadir as cartas do mundo todo. Falamos aqui de frescor e intensidade, resultado de um processo em que o suco das uvas brancas passa longo tempo em contato com as cascas (como ocorre com os tintos), ganhando cores e sabores expressivos, taninos e complexidade aromática. “O legal do laranja é a versatilidade para acompanhar a comida, isso para bar funciona superbem”, diz Maíra, que vê no cenário renovado um momento de desapego de antigas regras de etiqueta e “uma troca mais divertida e genuína”.

Os custos das melhores produções pequenas e orgânicas não fazem dos vinhos naturais baratos, mas as taças a partir de 35 reais nos novos bares regulam com o preço de drinques nos balcões da moda. No despojado Tão Longe, Tão Perto, por exemplo, vinhos brasileiros de produção sustentável são servidos em taças de 150 mililitros por 20 reais, e em cadeiras de praia na calçada os frequentadores seguem o caminho espontâneo de bebidas que combinam com o clima da cidade. “Há maior busca pelos brancos, além de tintos com menos extração e menos barrica, como os claretes”, diz a sommelière e empresária Gabriela Monteleone, sócia e autora do livro Conversas Acerca do Vinho. O tal clarete é parte de um vocabulário novo que também sublinha termos como pét-nat. O primeiro fica entre os tintos e rosés, feito com mescla de uvas brancas e tintas, de corpo leve, jovem e frutado. O pét-nat, por sua vez, abrevia o termo francês “pétillant naturel”, método ancestral de borbulhantes de única fermentação, engarrafados no meio do processo e de bolhas delicadas.

A ascensão do vinho branco, por sinal, é um dado relevante num mercado historicamente dominado pelos tintos, e demonstra que os consumidores vêm buscando, de fato, alternativas mais leves, frescas e de menor teor alcoólico. Sommelière experiente e sócia da chef Monique Gabiatti no Belisco, Gabriela Teixeira atesta: há uma década, quando trabalhou na extinta Bottega del Vino, no Leblon, os tintos respondiam por 70% das vendas mesmo no verão. Hoje, em seu novo bar, os brancos, rosés e laranjas ficam com 80% dos pedidos. Um fenômeno que se repete em salões recém-abertos como o Virtuoso, animado bar em Ipanema dedicado ao vinho natural. Ali é a casa do casal baiano formado pelos sommelier Bernardo Goes e a mulher, Mel Romariz, que viajou pela América Latina e Europa explorando dezenas de bares de vinhos e escolheu o Rio para o investimento. “É um público entre 30 e 40 anos que está cansado de padronizações e não vê prazer no mais do mesmo. Criam-se ambientes de interação sem formalidade, é a desconstrução dos enochatos”, diz Bernardo, que recebe a turma do pós-praia de cangas e biquínis no fim de semana.

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