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Delícias e encrencas

Fundador do Garcia & Rodrigues e da Fiammetta, o polêmico restaurateur João Luiz Garcia investe 2,2 milhões de reais na abertura de um empório gourmet de alto padrão no Jardim Botânico

Por Fabio Codeço
Atualizado em 5 jun 2017, 14h40 - Publicado em 27 jan 2012, 18h40
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gastronomia1.jpg (Redação Veja rio/)
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Geleias especialíssimas encontradas apenas no exterior. Terrines e patês feitos com os melhores ingredientes do mercado. Fornadas de pães fresquinhos que saem de hora em hora. Tudo em um só lugar. Que apreciador da boa mesa não se sente como criança em um parque de diversões diante de tantas iguarias? Frequentar empórios gourmets é um programa comum nas principais metrópoles do mundo. Eataly, em Nova York, Fauchon, em Paris, e Casa Santa Luzia, em São Paulo, são exemplos emblemáticos. No Rio, talvez pela vocação da cidade para a prática de atividades ao ar livre, esse tipo de estabelecimento é escasso. Restringe-se a uma ou outra loja de importados, mas nada que se compare às megastores que viraram atração turística em outras paragens. Foi com o intuito de preencher essa lacuna gastronômica que o restaurateur João Luiz Garcia decidiu levar adiante um projeto que acalentava desde o momento em que pôs os pés fora da sociedade do finado Garcia & Rodrigues. Janjão, como é conhecido, promete abrir neste sábado (28) a Casa Carandaí, a mais nova delicatessen da cidade. ?Teremos produtos exclusivos que muitos cariocas nunca sonharam ver?, anuncia o empresário.

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São iguarias de cinco países europeus e quatro estados brasileiros (veja alguns deles no quadro). Da Serra da Canastra, em Minas Gerais, virá um dos trunfos do endereço no Jardim Botânico: um queijo de casca amarela e sabor bem pronunciado cuja produção não passa de 100 unidades por dia. Ficará acondicionado em uma cave elétrica, espécie de adega, que permite ao consumidor saboreá-lo em diferentes graus de maturação. Entre os entendidos, esse processo é chamado de affinage. ?Junto com a goiabada de Ponte Nova teremos o melhor romeu e julieta da cidade?, declara Janjão, deixando a modéstia completamente de lado. No térreo do casarão localizado na Rua Lopes Quintas, a poucos metros do Lorenzo Bistrô, restaurante que toca ao lado da sócia e mulher Nick Barcelos, estarão disponíveis mais de 2?000 itens. A lista passa por biscoitos, compotas, embutidos, carnes, azeites e vinhos exclusivos. O espaço contará ainda com rotisseria e padaria. De cinco fornos sairão ciabattas, focaccias e baguetes. Essas últimas tiveram a receita escolhida a dedo. Depois de um ano à procura da fórmula ideal, os dois descobriram uma deliciosa versão à venda num simplório mercadinho de Corrêas, em Petrópolis. Conversaram com o padeiro e aprenderam que o segredo era o fermento importado da Bélgica. Resultado: o pão sai com a casca firme e crocante e com a acidez na medida certa.

A empreitada marca a volta do economista – e advogado por imposição paterna – ao comércio de produtos finos, sua grande paixão. De certa forma, é uma tentativa mais pé no chão de revisitar aquele que foi seu maior sonho, e talvez sua maior frustração: o Garcia & Rodrigues. ?Desta vez estou mais comedido?, garante. A frase diz muito sobre o estilo dele e explica, em parte, o destino de seu saudoso empreendimento do Leblon. Quando ele foi inaugurado, em 1997, o Rio nunca tinha visto algo parecido. Misto de delicatessen, rotisseria, padaria, confeitaria, restaurante, adega e loja de utensílios de cozinha, o projeto saiu do papel cinco vezes maior do que havia sido pensado. A ousadia da proposta, aliada à falta de lucratividade e aos sucessivos desentendimentos entre os fundadores, fez a receita desandar. O próprio Janjão deixaria a operação do negócio em 2000, praticamente expulso, após episódios que envolveram chantagens entre os sócios. ?Fizemos um contrato de trabalho com o chef Christophe Lidy para que ele pudesse alugar um apartamento no Rio. Anos depois, ele amea­çou entrar na Justiça com uma ação trabalhista?, relembra. A causa, segundo Janjão, estava orçada em 3 milhões de reais.

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Homem de gosto refinado, apurado desde a adolescência, em casa e em incontáveis viagens ao exterior, Janjão sempre apreciou boa comida. Na Itália, percorreu a Sicília em busca dos melhores tomates secos do mundo. Encontrou-os em Siracusa, cidade aos pés do vulcão Etna. Provou a legítima pizza margherita em Nápoles, exemplares da nobre trufa negra na Provence, ostras fresquíssimas tiradas dos mares da Normandia. No Leste Europeu, região da qual virou habitué quando trabalhava em uma empresa do ramo de alimentação, conheceu inúmeros empórios. Na sua rotina por aqui, a busca pelos sabores que estarão à disposição dos gourmets não para – e a troca de ideias com outros apreciadores da boa mesa é constante. Janjão frequenta a mais notória confraria de vinhos da cidade, que reúne grandes conhecedores do universo de Baco, como o empresário Célio Pinto de Almeida e o maestro Aluisio Didier. Nesses encontros são esvaziadas garrafas de alguns dos rótulos mais caros do mundo, como o Château Margaux 1900, uma verdadeira raridade.

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Temperamental e de pavio curto, ele costuma ser identificado como um empreendedor inteligente, qualidade reconhecida até pelos seus adversários públicos. Um deles é o sócio carioca da pizzaria Bráz, com quem se desentendeu durante a gestão da Fiammetta. ?Sem dúvida é uma pessoa muito perspicaz, mas extremamente gananciosa. Não se importa de passar por cima de quem for para alcançar seu objetivo?, diz Eduardo Cunha. O gênio difícil, de fato, é mais uma marca registrada de Janjão. Sem medir palavras, ele aponta sua metralhadora verbal a ex-sócios e emite pareceres polêmicos sobre qualquer assunto. Em sua opinião, por exemplo, o polo gastronômico do Leblon corre o risco de desaparecer, em vista dos preços dos imóveis. ?Ele tem uma personalidade forte, sim. Quem gosta ama. Quem não gosta odeia?, afirma sua mulher.

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Falando rápido e emendando um assunto no outro, ele é uma figura divertida, que adora contar piadas e passagens de sua história, entremeadas com jargões da economia e muitos termos em inglês. Mas, apesar de ter saído brigado de todas as sociedades em que se meteu antes do Lorenzo Bistrô, já deixou sua marca na gastronomia carioca. A rigor, foi de sua cabeça inquieta que brotaram algumas das ideias mais inovadoras nos últimos quinze anos. Além do Garcia & Rodrigues, é preciso computar a Fiammetta, as pizzas e os serviços de alimentação implementados pelos Supermercados Zona Sul em suas unidades. No momento em que os cariocas ainda lamentam o fim de sua maior delicatessen, a Casa Carandaí chega como um bálsamo. Os amigos, com certeza, vão conferir. Os inimigos terão de engolir mais uma do Janjão.

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