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Carioca sobre quarentena na Itália: ‘É um eterno domingo’

Radicado no país desde 2016, Mario Viola, de 44 anos, se viu só após sua mulher e filhos voltarem para o Brasil e ele decidir ficar lá

Por Saulo Pereira Guimarães
Atualizado em 4 abr 2020, 11h52 - Publicado em 3 abr 2020, 12h02
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  • Era começo de março quando veio o primeiro decreto limitando a circulação de pessoas na Itália. As escolas foram fechadas no dia 5 e, uma semana depois, as restrições aumentaram. Desde então, bares e restaurantes funcionam apenas na base do delivery e só podemos sair de casa para ir ao mercado, farmácia ou médico. Mesmo com o coronavírus já assolando o país e matando as pessoas, tenho a impressão de que a ficha demorou a cair por aqui, para a população em geral. Mas eu percebi desde o começo que a solução do problema iria demorar, então decidi comprar logo as passagens para a minha família voltar ao Brasil. Logo depois as fronteiras italianas fecharam. E eu fiquei aqui, sozinho.

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    Estou habituado a trabalhar em home office, mas o duro é a perda da liberdade. E não é só isso. É a perda da liberdade aliada a uma solidão devastadora. Não posso estar com ninguém, nem para um café, um papo rápido. Isso de repente não é mais possível. Sinto que venho ficando ansioso, o que certamente se agrava pelo fato de estar longe da minha família. Tento manter uma rotina, apesar de o meu dia a dia ter mudado completamente. Estou acostumado, por exemplo, a ver meus parentes no Brasil uma vez por ano. Será que neste 2020 sombrio
    vou conseguir? Já começo a me conformar que não. A perda dessas interações humanas, desses momentos, me desperta uma certa nostalgia. Eu me sinto como se estivesse em uma espécie de regime de prisão domiciliar. É angustiante, sim, exige um esforço profundo de adaptação, mas estou convicto de que é a única ajuda que as pessoas podem prestar para conter a pandemia.

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    A vista do terraço da nossa casa em Florença é bela, mas o prédio está em obras. Há andaimes na frente da varanda. Mesmo assim, consigo ver as colinas de Fiesole lá longe e um parque que há aqui em frente. Está tudo vazio. É algo triste e surpreendente ao mesmo tempo. A sensação é de que todos os dias são como domingo. É um eterno domingo, com a mesma paisagem todos os dias, os mesmos carros ali parados. Uma paisagem estranhamente imóvel, congelada. Nas últimas semanas, a temperatura oscilou entre 15 e 20 graus. O frio atrapalha. Quando o sol se abre, ajuda. Dias bonitos são mais fáceis de levar. Olhe como a perspectiva muda: o supermercado virou meu lugar favorito, apesar das filas. É permitida a entrada de no máximo cinco pessoas na loja de cada vez. Em minha última ida até lá, demorou duas horas para eu ser atendido. Ali tenho alguma interação.

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    O sistema de saúde ainda não está completamente saturado aqui na Toscana, como em outros cantos da Itália. Sei, porém, que faltam ventiladores mecânicos. Não conheço ninguém que tenha pego o vírus, só pessoas que entraram em contato com gente doente, mas não se contaminaram. Observo uma onda de solidariedade se alastrando pelo país. Os moradores combinam para cantar nas janelas, um espetáculo. Uma amiga minha que mora em Roma descobriu, assim, que tem um vizinho cantor de ópera. A escola das crianças passou a disponibilizar aulas na internet. É como na guerra, dá­ se um jeito de seguir. Quando tudo isso acabar, quero descer e caminhar meia hora no parque, juntar meus amigos numa festa, passar um fim de semana na praia com minha família. São coisas simples, eu sei, mas que hoje viraram um luxo que ninguém pode ter.

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