‘Antes do Brasil da coroa, existe o Brasil do cocar’, alertou, sob aplausos, Celia Xakriabá, no final do encontro que foi batizado com este mesmo nome e reuniu a líder indígena, o cacique Mapu Huni Kuî e o produtor musical e DJ Alok, mediado por Marcos Nisti, da Maria Farinha Filmes. A urgência em compreender o passado, as tradições e a sabedoria dos povos originários norteou todo o painel, que integrou a programação do Rio2C, o maior evento de inovação e criatividade da América Latina, realizado entre os dias 26 de abril e 1º de maio na Cidade das Artes, na Barra.
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O quarteto exibiu, pela primeira vez, trechos do documentário produzido a partir do encontro musical entre Alok, Célia e outras lideranças indígenas, de povos como Yawanawa, Kariri-Xocó, Huni Kuin e Guarani. A experiência foi compartilhada com o público, que soube dos detalhes que cercaram as gravações, realizadas ao longo de 45 dias, entre rituais, processos criativos e apresentações. Roteirista do documentário, Célia aponta para a necessidade de indigenizar o pensamento:
“Às vezes, me perguntam onde está a intelectualidade da mulher indígena. Nós escrevemos não somente com as mãos, nosso roteiro foi escrito com o coração, com jenipapo, com urucum, com a força da terra, que é o mais importante. Não podemos mais conhecer o Brasil sem conhecer o Brasil indígena. Antes de tudo tem o Brasil da mata, o Brasil nasce das mulheres indígenas”, disse, emocionada, durante o debate, que foi iniciado com uma apresentação musical de Mapu.
“Música para nós é concentração e equilíbrio, é cura. Nossa música é reza, nossos cânticos vem dos pássaros, é a mensagem da floresta que traz a cura e terapia espiritual para nosso povo”, disse o cacique, cuja fala foi reiterada por Alok, que afirmava ter recorrido diversas vezes durante a pandemia para a música dos povos originários.
A relação do músico com a causa não é recente. Sua busca pela herança dos povos indígenas deu origem a seu primeiro álbum autoral, O Futuro é Ancestral, e também foi um dos motivos para a fundação do Instituto Alok. Neste trabalho, ele gravou 130 músicas tradicionais indígenas, em uma forma de preservar a tradição.
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“Eu digo que este trabalho não é meu e não pode ser meu. Eu sou apenas um instrumento para as vozes indígenas. Eu sempre vou participar se eu puder ecoar as vozes indígenas o mais longe que for possível”, conta Alok, que participou de diversos rituais de ayahuasca ao longo de todo o processo, ponto definidor para a criação do projeto. Nos últimos meses, ele participou também de diversos atos em defesa da Demarcação de Terras Indígenas, defendido intensamente por Célia e Mapu.
“Todos os territórios que temos demarcados hoje foram demarcados após a morte de uma liderança indígena. Somos 5% da população do mundo e defendemos 83% dos biomas do mundo. Sem demarcação dos territórios indígenas, não vai dar para barrar e romper essas mudanças climáticas. Não vai existir a cura do corpo se não existir a cura da terra”, alertou Célia, que foi aplaudida de pé após o encontro.
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O Rio2C segue com outros painéis que debatem a diversidade até o próximo dia 1º de maio. A grade completa do evento está disponível no site: https://www.rio2c.com/programacao.