Nos próximos dias, as linhas telefônicas do Comitê Organizador da Rio 2016 prometem ficar congestionadas. Da mesma forma, o site está sujeito a sobrecarga de acessos. Não se trata, porém, de uma corrida repentina aos ingressos para uma das contendas esportivas — o início das vendas está previsto apenas para março do ano que vem. A disputa, aqui, é entre os muitos interessados em trabalhar voluntariamente na Olimpíada: no sábado (15), termina o prazo para se candidatar a uma das 70 000 vagas disponíveis. Até a semana passada, já haviam sido registradas mais de 140 000 inscrições oriundas de 180 países — a expectativa da organização é de um total de 210 000. “Como faz parte da nossa cultura deixar tudo para o último dia, acreditamos que haverá um boom nesta reta final”, afirma Henrique Gonzalez, diretor de recursos humanos do comitê.
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O cadastro é apenas a primeira etapa até — para usar uma expressão comum entre atletas — a conquista da tão sonhada vaga. Grosso modo, o processo de seleção se assemelha ao aplicado por qualquer grande empresa. Há um exercício on-line, um teste de nivelamento de idiomas (apenas para quem domina línguas estrangeiras) e uma dinâmica de grupo presencial. Mas a lista de pré-requisitos é bem menos escrupulosa do que as adotadas no mundo corporativo. As únicas exigências se referem à disponibilidade de tempo — para a seleção, os treinamentos e o trabalho propriamente dito — e à idade mínima — 18 anos, completados até 28 de fevereiro de 2016 (confira as recomendações no quadro).
A vontade de participar, porém, é tanta que há quem tenha se inscrito a considerável distância da maioridade, caso da estudante Maitê Christino, de 16 anos. “Para a minha sorte, terei a idade necessária até a data estipulada. Quero ajudar a fazer a Olimpíada acontecer”, diz a jovem. Na outra ponta da escala etária, há inscrições como a da terapeuta corporal Rosenira Tavares, de 72 anos, uma apaixonada por esportes. “O espírito olímpico sempre esteve em mim. A ideia de vencer desafios prepara as pessoas para a vida”, acredita a carioca, que, como qualquer candidato, se for aprovada, não vai ganhar um tostão. Nem as despesas extras de quem vem de fora do Rio, como o deslocamento até a cidade e a hospedagem, são pagas pela organização. Nada disso parece afugentar os interessados, que buscam algo além do retorno financeiro. “A oportunidade de estar em contato com os atletas nesse ambiente multicultural não tem preço”, garante a francesa Hélène Verdier, de 27 anos, uma das candidatas estrangeiras. A afirmação da moça, que mora no Rio há um ano, é feita com conhecimento de causa de quem já trabalhou nos Jogos de Londres, em 2012, auxiliando a equipe de futebol para cegos de seu país. Sua opinião é compartilhada por outros veteranos no voluntariado, a exemplo do biomédico Phelipe Oliveira, de 23 anos, cujo currículo inclui passagens por eventos como os Jogos Mundiais Militares de 2011, a Copa das Confederações de 2013, o Mundial e os Jogos Sul-Americanos do Chile deste ano. “Todo mundo deveria passar pela experiência de trabalhar sem ser por obrigação. É mais prazeroso, já que você está ali porque quer”, opina o carioca, aspirante desta vez a uma vaga na seção de controle de dopagem.
Embora tenha sido conceituado oficialmente apenas na década de 90, em um glossário olímpico produzido como parte do Relatório Oficial dos Jogos de Barcelona (1992), o trabalho abnegado nas Olimpíadas remonta à competição realizada em Atenas, em 1896. Nos Jogos de Los Angeles, em 1984, os ajudantes, pela primeira vez envergando uniformes, ganharam força inaudita: foram cerca de 30 000, divididos em tarefas que iam de assistência a competições a serviços de tecnologia, passando por atendimento à imprensa e acompanhamento de delegações. Desde então, sua importância só fez crescer, sendo hoje peça fundamental no evento. Trabalhar de graça, quem diria, aqui é como conquistar uma medalha.