A produção lembra a da cerimônia do Oscar, mas com trilha sonora eclética: vai ter Grammy Latino nesta semana. No mais famoso prêmio da indústria fonográfica, em meio ao desfile de medalhões nacionais e estrangeiros, nomes do porte de Andrea Bocelli, Enrique Iglesias e Djavan, a anônima Lisa Akerman está no páreo, na disputa pelo troféu de melhor projeto gráfico. Designer, ela é a criadora do trabalho indicado, uma bela embalagem para Atlas, o segundo álbum da banda Baleia. Você não conhece, mas os seus filhos gostam. Representante de uma nova geração na música, e na maneira de produzi-la, o grupo carioca, em atividade desde 2010, começa a alçar voos mais altos. Curiosamente, o convite para participar da 17ª edição da prestigiosa cerimônia, na T-Mobile Arena, em Las Vegas, na quinta (17), foi motivado por um CD — objeto quase obsoleto nos dias de hoje — em forma de livro, com delicadas ilustrações de Lisa para as oito canções gravadas. Essa aposta original levou o sexteto ao centro dos acontecimentos do mundo pop, mas seu dia a dia não costuma ser tão glamouroso assim: inclui muita atividade on-line e trabalho duro para alcançar as plateias onde elas estiverem.
Neste caso, o esforço vem dando bom resultado. Single do primeiro álbum, Casa chegou a ser a 30ª música mais compartilhada do mundo no Spotify, plataforma na qual o Baleia mantém uma média de 50 000 streamings (execuções) por mês, em um total que já chega a 2,1 milhões. O recado é claro: quando a estratégia funciona, a multidão virtual transforma-se em plateias cheias e potencialmente rentáveis. São marcos dessa virada (aquele momento em que se troca o aperto de espaços cult por shows mais espaçosos) apresentações dos músicos como a feita nos pilotis do Museu de Arte do Rio, em que a área foi tomada pelo público. Outros artistas em ascensão seguem a fórmula que passa pelo estouro nas redes sociais antes do pé na estrada, com direito a consagração diante da plateia carioca (veja o quadro). O mérito é deles. “Já fomos procurados por todos os grandes selos do mercado, mas recusamos para manter a independência do grupo”, conta Ricardo Rodrigues, produtor e agente da banda Liniker e os Caramelows.
Essa autonomia tem seu preço. “Na era do download, quando as gravadoras já não têm a capacidade econômica para apostar em novos talentos, as bandas independentes precisam desenvolver as próprias estruturas de marketing e trabalhar em divulgação para aumentar sua base de fãs”, ensina Luiz Calainho, sócio da Musickeria, gravadora que trabalha em parceria com patrocinadores corporativos e grandes marcas para investir em música. Do lado de cá do mundo virtual, a rotina é de trabalho duro, como VEJA RIO testemunhou em recente viagem do Baleia por São Paulo. Na capital, o grupo abrigou-se na casa dos pais do violinista Felipe Ventura, com direito a gente dormindo no sofá. No dia seguinte, uma sexta‑feira, partiram bem cedo, de van, para Sorocaba, onde tocaram em uma pequena sala de espetáculos. Depois do bis e da volta a São Paulo, na mesma madrugada, todos tomaram o rumo do Rio, de ônibus, onde um show na Fundição Progresso os aguardava no sábado. “É trabalho, cansativo como qualquer outro”, reconhece Sofia Vaz, que divide os vocais da banda com o irmão, Gabriel. Completam o sexteto, que dá conta de dez instrumentos, Cairê Rego, David Rosenblit e João Pessanha.
O esforço da trupe já garantiu lugar na edição brasileira do prestigiado festival Lollapalooza, em 2015, além de música em campanha publicitária de alcance mundial e um contrato com a Sony Music adaptado à realidade atual: como produto digital. As viagens revelam ainda públicos de animação e quantidade insuspeitos, superiores aos do Rio, caso de Goiânia e João Pessoa. Mas os fãs cariocas se superam: na noite de sábado na Fundição, após o périplo por São Paulo, a jovem fã Ariel Carvalho, 21 anos, exibiu para os ídolos sua tatuagem no formato de uma baleia — a terceira que o grupo conheceu no mesmo fim de semana de miniturnê. A internet, como se vê, traz até amor verdadeiro.