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Disputado na TV, Cauã Reymond busca papéis alternativos no cinema

Prestes a estrear na comédia "Uma Quase Dupla", o ator assina produção de diversos projetos e faz planos para dirigir um filme

Por Sofia Cerqueira, Renata Magalhães
Atualizado em 13 jul 2018, 08h00 - Publicado em 13 jul 2018, 08h00

 

Cauã Reymond
(Marcelo Tabach/Veja Rio)

A frase, dita em tom profético por uma pessoa influente do meio artístico, jamais foi esquecida por Cauã Reymond. Na época, o então jovem estreante, campeão de jiu-jítsu, modelo, surfista de cabelos encaracolados e que fazia seu primeiro papel em Ma­lhação, engoliu em seco ao ouvir: “Com esse biótipo você nunca vai ser protagonista”. Pouco depois, quando surgiu a chance de debutar em uma novela, um colega da TV Globo foi ainda mais cruel: “Mas você sabe andar e falar ao mesmo tempo?”. O ator não só não se abateu diante das perguntas e dos comentários capciosos como se transformou em um dos nomes mais requisitados da televisão e do cinema. No dia 19 chega às telonas Uma Quase Dupla, em que ele estreia no gênero comédia escrachada vivendo um policial apatetado ao lado de uma detetive sagaz, interpretada por Tatá Werneck. Nos próximos meses será lançado o filme Piedade, em que Cauã aparece totalmente despido em cenas tórridas com Matheus Nachtergaele. Tem mais. Ele acabou de gravar a série Ilha de Ferro, cuja trama gira em torno do trabalho e dos dilemas na vida em uma plataforma de petróleo, e se prepara para rodar um longa na pele de dom Pedro I. Ainda está escalado para ser o par romântico de Paolla Oliveira em Troia, novela das 9 que irá ao ar no primeiro semestre de 2019. Só um detalhe: em todas as produções Cauã é protagonista. “Lá no início, quando duvidaram de mim, fiquei calado. Minha resposta sempre foi o trabalho”, orgulha-se.

Trabalho, a propósito, é o que não falta ao carioca de 38 anos, dezesseis de carreira. A carapuça de galã lhe caiu como uma luva. Ele, no entanto, não se deixou inebriar pelo rótulo, tampouco se acomodou nesse pedestal. A trajetória do ator, que estreia o seu 21º filme, deixa isso claro. Seu rosto aparece em produções de baixo orçamento e blockbusters, passando por fitas mais comerciais como Uma Quase Dupla. A ideia da comédia policial surgiu de uma conversa do próprio Cauã com a produtora Bianca Villar, desenvolvida depois por uma equipe de roteiristas encabeçada por Leandro Muniz. Tendo como cenário Joinlândia, uma cidadezinha joia até virem à tona os crimes de um serial killer, a história subverte a imagem que o público faz dele. Não só pelo bigodão e pelas madeixas acaju, mas sobretudo pela interpretação, quase no estilo pastelão. “Sou movido a desafios. E talvez esse tenha sido um dos maiores dos últimos tempos”, avalia o ator, que confessa ter ficado tenso nas gravações. “Eu vinha de dramas pesados na TV e ainda tinha ao meu lado a Tatá, que admiro e é fera no improviso. Fiquei nervoso mesmo.” Com o objetivo de viabilizar projetos em que acredita, caso do longa cômico, o ator tem atuado como produtor. Para se transvestir de Pedro I não será diferente. Ele está ajudando a captar recursos para o filme, que deve ser gravado a partir de outubro, no Brasil e em Portugal. “Além da alma de empreendedor, o Cauã tem uma característica rara em atores da sua idade e tamanho: a disposição para se arriscar e se reinventar”, elogia José Luiz Villamarim, que o dirigiu em trabalhos na TV como a novela Avenida Brasil e a série Amores Roubados.

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Em tempos em que medalhões da Globo vêm sendo dispensados sumariamente, Cauã também destoa. Faz parte de um seletíssimo grupo que tem contrato fixo. Embora períodos de “descanso da imagem” sejam normais nesse tipo de acordo, ele surpreendeu muita gente, há cerca de três anos, ao procurar a direção da emissora pedindo um tempo fora do ar. “Sou um cara superprofissional, mas vinha trabalhando direto fazia anos e tinha vivido momentos delicados”, conta. A fase coincidiu com os meses que sucederam à separação da atriz Grazi Massafera, mãe de sua filha, Sofia, 6 anos. O período sabático durou pouco. Encantado pelos formatos inovadores na TV e pela chance de trabalhar com nomes que admira, como ocorreu nas séries Justiça e Dois Irmãos, Cauã voltou ao batente. Embora ocupe o posto de estrela global, ele é capaz de tomar a iniciativa, procurar um cineasta e bancar do próprio bolso a passagem até outro estado só para fazer um teste. Foi assim no longa Falsa Loura, de Carlos Reichenbach. Também já aceitou trabalhos antes de saber qual seria o seu papel só pela oportunidade de estar ao lado de atores e diretores que reverencia. O filme Piedade, dirigido por Cláudio Assis, conhecido por produções ousadas de custo miúdo (Amarelo Manga e Febre do Rato), é um exemplo. “O Cauã é um molecão muito sério no trabalho, que se entrega ao personagem. Apesar do status, ele se propôs a abrir mão do tempo que fosse necessário para o projeto”, destaca Assis. Na tela, o ator interpreta um dono de cinema pornô e aparecerá em cenas fortes de sexo com o executivo vivido por Matheus Nachtergaele. “Os dois brincavam, tiravam onda um com o outro para descontrair e, na hora H, estavam intensos, viscerais”, exalta o diretor.

Cauã Reymond
(ARTE/Veja Rio)

Num trelelé caliente, seja com um ator, seja com uma atriz, o humor é o recurso usado por Cauã. Na megaprodução Ilha de Ferro, ainda sem data de estreia, mas com a segunda temporada confirmada, ele encarna o petroleiro envolvido num triângulo amoroso com as personagens de Maria Casadevall e Sophie Charlotte. Enquanto aguardava ajustes de luz em uma cena de sexo, ele quebrou o embaraço comum a essas gravações com um insólito comentário. “Eu estava ali tenso, deitado, de tapa-sexo, e comecei a citar a escalação do Tite para a Copa que via no celular”, diverte-se. Quem acompanhou as filmagens da série afirma que não dá para imaginar a saga sem ele. “É um cara que tem humildade para aprender, está sempre atento e absorvendo coisas novas. Por isso, chegou aonde chegou”, avalia Afonso Poyart, diretor da trama. O ator diz que não só cresceu profissionalmente durante as filmagens, como amadureceu o olhar para questões ligadas ao feminismo com Maria e Sophie, defensoras conhecidas da causa. O próprio Cauã afirma que foi vítima de assédio sexual nos tempos de modelo. “Era uma cantada, uma indireta, às vezes uma mão que descia para um lugar que não devia”, relata. “O assédio aconteceu tanto por parte de mulheres quanto de homens, mas sempre soube me colocar com firmeza e o negócio não ia adiante”, completa. Filho de uma astróloga e de um psicólogo que não se casaram, ele morou no Rio, em Friburgo e em Santa Catarina e mudou de escola incontáveis vezes. A adaptação nem sempre foi fácil e Cauã, dono de lábios carnudos — hoje alvo de elogios — sofreu bullying de colegas de classe por causa disso. “Em alguns momentos foi difícil, mas por sorte não tenho traumas com relação a isso. Nunca me considerei um garoto bonito, mas acho que a idade está sendo generosa comigo”, admite.

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Quem conhece Cauã sabe que sua imagem, bela (é indiscutível) e politicamente correta, não é fachada. A seriedade com que conduz o ofício se repete na vida particular. Apaixonado pela natureza, defende causas como a sustentabilidade e usa seu Instagram, com 7,2 milhões de seguidores, para apoiar iniciativas contra o racismo e a homofobia. Embora não seja praxe no âmbito doméstico, faz questão de pagar acima da média e dar plano de saúde aos seus empregados. “Não nasci em berço de ouro e tenho consciência de que sou privilegiado. Tento ser generoso com quem me cerca”, argumenta. Cauã — 1,82 metro de altura e 78 quilos — também é adepto do estilo saudável: surfa, pratica boxe, musculação e ioga. A combinação ator-apolíneo-engajado-­atlético, mesmo que não seja intencional, funciona como um ímã para o mercado publicitário. Só para citar alguns, fez campanha para a grife francesa Givenchy ao lado de Gisele Bündchen, é embaixador da Armani no Brasil e estrela comerciais de marcas como Land Rover, Colcci e Vivara. Caseiro e low profile, ele, porém, virou manchete há dois meses ao ser pego numa blitz da Lei Seca. Contou que havia saído para comer pizza e tomara uma taça de vinho, que se arrependia de dirigir assim e iria pagar, como qualquer cidadão. “Não sou um cara da noitada, de bebida ou drogas. Acho que o esporte me ajudou nisso. Já fumei maconha, como muitos jovens, mas nunca tomei uma droga sintética, por exemplo”, afirma. Determinado a se aprimorar, lê compulsivamente jornais, revistas estrangeiras e biografias de grandes personalidades. “Ele é focado, tem fome de aprender. Vive me dando dicas e quem sabe venha a me dirigir um dia”, conta Mariana Goldfarb, modelo e apresentadora de programas de esporte no Canal Off, sua namorada há dois anos e meio.

A exemplo de outros festejados atores, como Selton Mello e Wagner Moura, Cauã flerta com a direção. Só garante ser um plano mais para a frente. E a carreira internacional? “Se pintar um trabalho, claro que vou aceitar, mas não rola viver fora agora. Prefiro ser um pai bem-sucedido a ter uma estatueta na estante”, diz ele, que quer ter mais filhos. Com a guarda compartilhada de Sofia, é do tipo que brinca de LOL (bonecas em miniatura que viraram febre) e faz questão de viver com a nova casa, no Joá, cheia de amiguinhas da filha. Como muitos colegas de profissão, não esconde que sofre de um dos males da modernidade: a ansiedade. “Nunca cheguei a tomar remédio, mas ficava muito tenso na véspera de uma cena importante, sempre me cobrava demais. Hoje continuo intenso no trabalho, mas aprendi a relaxar”, explica o ator. Ele buscou a ajuda de um mestre da bioginástica, que tem um trabalho de respiração, e faz análise desde os 14 anos. O garoto que sonhava ser político (é isso mesmo) está, como grande parte da sociedade, descrente diante dos rumos do país e teme a violência. Recentemente, voltando de uma gravação na Ilha do Governador, precisou agachar-se dentro do carro quando se viu em meio ao fogo cruzado entre militares e traficantes na Linha Vermelha. Seu maior receio, no entanto, surpreende: “Tenho medo de envelhecer só”. Fica não, Cauã. Não vai faltar companhia. ß

 

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