Definir a obra de William Shakespeare como “universal” tornou-se um lugar-comum dos mais óbvios, repetido igualmente por especialistas e meros apreciadores das peças do bardo inglês. Pouca gente sabe, porém, que tal abrangência já era testada de forma prática ainda na época do autor, com a encenação invariavelmente bem-sucedida de seus textos fora da Inglaterra. Hamlet, por exemplo, foi montado em 1608 dentro de um navio mercante ancorado na costa do Iêmen, e, poucos anos depois, começaria a percorrer o norte da Europa. Nada remotamente comparável, entretanto, ao que a companhia teatral do renomado Shakespeare’s Globe, de Londres, vem fazendo desde abril, quando se lançou em uma turnê que promete levar a tragédia do príncipe da Dinamarca a 205 países, mais do que a quantidade de estados-membros da Organização das Nações Unidas. A empreitada chega ao Brasil na próxima terça (25), para três apresentações em São Paulo, antes de desembarcar no Rio, onde ocupará o Teatro de Câmara da Cidade das Artes no domingo (30) e no dia 1º de dezembro. Detalhe: mesmo sem nenhum alarido na divulgação do espetáculo, os ingressos para as sessões cariocas estão esgotados desde maio. “Não há um só país no mundo que não queira um pouco mais de Hamlet. É uma peça fantasticamente rica e variada, que fala de maneiras distintas para cada local”, diz Dominic Dromgoole, diretor artístico do Shakespeare’s Globe e da montagem.
Doze atores integram o projeto, mas se alternam em grupos de seis por sessão — cada papel tem dois intérpretes, precaução compreensível no caso de uma turnê tão longa. Na pele do protagonista estão o nigeriano Ladi Emeruwa e o inglês de origem paquistanesa Naeem Hayat (ainda não foi informado quem estará em cada apresentação no Rio). Atores de diversas etnias, aliás, são uma marca do Shakespeare’s Globe, uma reconstrução inaugurada em 1997 (a pouco mais de 200 metros de distância do original, diga-se) do afamado Globe Theatre, palco de várias estreias do dramaturgo. Construído em 1599, o teatro foi destruído por um incêndio em 1613, reerguido um ano depois e, finalmente, demolido três décadas mais tarde. Nos últimos dois anos, a companhia itinerante da instituição vem montando clássicos de Shakespeare em diversas partes do mundo, mas é a primeira vez que uma mesma peça é encenada em tantos países. “Há uma série de desafios logísticos. Temos fases mais difíceis, mas de longe compensadas pelos bons momentos”, diz Tom Bird, produtor executivo da turnê. Ao contrário de Hamlet, eles não vivem o dilema de ser ou não ser.
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