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Mônica Martelli e Ingrid Guimarães celebram o sucesso no humor

Precursoras da nova geração de comediantes, elas são amigas há 20 anos. A convite de VEJA RIO, se encontraram para falar sobre vida e carreira

Por Daniela Pessoa Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 Maio 2017, 10h00 - Publicado em 27 Maio 2017, 10h00
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  • Um dos maiores fenômenos de audiência do teatro brasileiro, a comédia Os Homens São de Marte… E É pra Lá que Eu Vou arrebanhou mais de 2,5 milhões de espectadores desde a estreia, em 2005. Não à toa, alçou a atriz e roteirista Mônica Martelli ao rol de estrelas do humor nacional. O espetáculo virou filme em 2014, tornou-se série de TV e acaba de ganhar uma divertida sequência nos palcos. Em cartaz no Teatro dos Quatro, na Gávea, Minha Vida em Marte marca a volta de Mônica ao tablado. Do outro lado da cidade, nos estúdios da TV Globo no Projac, Ingrid Guimarães se aventura na novela das 6, Novo Mundo, encarnando sua primeira vilã. A atriz de maior bilheteria do cinema nacional, com as franquias De Pernas para o Ar e Loucas para Casar, retorna à grande tela em janeiro de 2018, com o longa Fala Sério, Mãe, baseado no livro de Thalita Rebouças. Em comum, Mônica e Ingrid têm o dom de transformar as dores e as delícias do universo feminino em diversão e sucesso. A convite de VEJA RIO, a dupla que compartilha uma sólida amizade há vinte anos se encontrou para falar sobre carreira, feminismo e, é claro, humor.

    Mônica – Em 1996, a gente fez teste para o programa Chico Total, do Chico Anysio, e passamos. Os aprovados tinham que ir para uma sala fechar o contrato, e a Ingrid já estava lá dentro quando entrei. A gente não se conhecia, mas ela pegou uma agenda e, disfarçadamente, escreveu assim para mim: “Vão te oferecer 800 reais. Não aceita, pede mil”.

    Ingrid – Sororidade desde o início.

    Mônica – Ela ainda me ofereceu carona num Escort vermelho e acabou a gasolina no meio da Praia do Leblon. Fomos empurrando o veículo até o posto mais próximo, conversando normalmente. Ficamos amigas de cara.

    Ingrid – Uma vez, estava eu, Mônica e Paulo Gustavo num restaurante, e a Julia Lemmertz numa mesa próxima. A gente ria tanto que ela levantou, caminhou até a gente e disse: “Pelo amor de Deus, quero ser amiga de vocês! Eu quero rir também!”.

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    Ingrid – A gente estava sempre sofrendo por amor naquela época. Mas, graças a Deus, nunca dividimos nenhum homem. Gostamos de tipos diferentes. A Mônica é a mais eclética (risos). Nossa primeira viagem juntas foi para Mauá, queríamos nos curar de relações frustradas.

    Mônica – Alugamos um quarto numa pousada baratinha e, quando entramos, tinha o maior clima de romance. A cama era de casal, devem ter achado que éramos gays. À noite, acendemos a lareira e o fogo lambeu tudo. Saímos gritando e correndo pelos corredores. No mesmo dia, conhecemos um cara que era dono de uma pizzaria e ficou pregando ensinamentos de Osho para nós. A partir dali, tudo virou Osho na nossa vida. Uma loucura.

    Mônica Martelli e Ingrid Guimarães
    (Anna Fischer/Veja Rio)

    Ingrid – Uma vez, num Réveillon em Caraíva, na Bahia, cada uma se apaixonou por um cara. O da Mônica era dono de uma loja na vila. O meu, garçom. No final, fui parar com ele numa canoa que ficava estacionada na varanda do cafofo do namorado da Mônica. Era uma canoa dura, mas, aos 20 poucos anos e apaixonada, você não sente nada. Nem dor, nem mosquito.

    Mônica – Depois daquele Ano Novo, queríamos voltar de qualquer jeito para Caraíva. Como éramos duras, tive a ideia de montar uma banda de forró para a gente se apresentar em troca de comida e hospedagem de graça. O dono da pousada topou, mas não rolou porque a Ingrid não gostou do figurino de botas e sainha. Achou que o look não ficava bem nela.

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    Mônica – Na minha primeira peça, tem uma parte em que eu digo: “Natalie gosta da classe trabalhadora”. A Natalie é aquela Ingrid que se apaixonou pelo garçom da Bahia. Nossos trabalhos são muito autorais. A gente escreve o que vive, e por isso o público se identifica tanto.

    Ingrid – Quando gravei o filme De Pernas Para o Ar, a questão era a mulher que não gozava mais porque tinha que trabalhar, cuidar do filho… Muitas mulheres vivem isso na vida real. Nessa época, eu estava amamentando minha filha e a levava para o set direto. Dava de mamar com um monte de vibrador em volta (risos).

    Mônica – Agora eu interpreto uma mulher de 45 anos lutando para manter o casamento. É complicado, porque a rotina faz a gente adiar o sexo. Com o marido ali do lado sempre, você pensa “ah, hoje não… Amanhã eu transo”. O problema é que o amanhã vira depois de amanhã, e o casal nunca transa.

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    Mônica – Tenho uma relação muito forte com o feminino e sempre me interessei pelas histórias de amor. Se eu vejo um filme de guerra, tem que ter cena de romance no meio. Talvez pelo fato de eu ter sido criada por uma mãe feminista eu não tenha vergonha de falar que gosto de estar apaixonada. Feminismo é liberdade, é ir atrás dos seus desejos ou simplesmente poder falar para o seu marido que você não está a fim de transar. Não é sinônimo de mulher solteira com pelo no sovaco. Amor não é fraqueza.

    Mônica Martelli e Ingrid Guimarães
    (Anna Fischer/Veja Rio)

    Ingrid – Minha mãe é advogada de petróleo atuante até hoje, aos 70 anos. Nunca a vi sem trabalhar. Atualmente, ela faz parte de um escritório onde todos os sócios são jovens e homens. Então, enfrenta preconceito não só de gênero como de idade.

    Mônica – Minha mãe foi a primeira vereadora eleita em Macaé, sempre foi um ser político. Um dia, entrou no quarto da minha filha, me puxou num canto e disse: “Não tem como você criar uma menina saudável com essa quantidade de brinquedos e roupas”. Ela levou metade para doar. Não fui criada nem para casar, mamãe dizia que mulher tinha que ser independente.

    Ingrid – Quando penso que minha avó não assinava cheque… Era o vovô que assinava por ela. Tem homem que acha o feminismo chato, e até mesmo mulheres olhando torto para o movimento. Chato ou não, ele é importante. No início, tem que ser assim, precisa incomodar mesmo.

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    Mônica – É difícil mudar a mentalidade. Somos machistas todos os dias, sem perceber. Está arraigado quando digo para minha filha, por exemplo, “isso não é coisa de menina”. Meu último namoro foi um relacionamento abusivo e eu não sabia. Ele diminuía meu trabalho e eu aceitava achando que era normal. Chegou ao ponto de eu precisar mentir e dizer que estava na dermatologista quando na verdade estava numa reunião, porque ele tinha ciúme da minha carreira.

    Ingrid – Mas tem muito homem tentando se adaptar a essa nova mulher. Meu marido é um excelente pai, por exemplo, divide as tarefas comigo. Como estou gravando muito, ele é quem vai às reuniões de escola da nossa filha. Eu fico até constrangida perante as outras mães.

    Mônica – A gente vive num mundo em que a mulher com mais de 40 anos passa a ser invisível. A juventude é muito valorizada. Então, o fato de eu ser chamada para fazer uma propaganda de remédio ginecológico é algo que maravilho. Triste seria não ser chamada para nada, seja comercial do que for, inclusive de dentadura. Temos que falar para a nossa geração. O preconceito também é achar que outros interesses e faixas etárias não interessam.

    Ingrid – Ser chamada para fazer propaganda de produtos mais delicados não tem a ver com idade, mas com humor. E é isso: ao mesmo tempo em que envelhecemos, podemos dar voz a uma geração que envelhece junto conosco.

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    Ingrid – Estava lendo outro dia que, a cada minuto, uma mulher faz aborto no Brasil. E muitas delas morrem em razão da ilegalidade do procedimento. Não sou a favor do aborto em si, pois acho que é uma violência ao corpo. Quem fez não esquece. Mas sou totalmente a favor da legalização.

    Mônica – A mulher que resolve interromper sua gravidez não pode ser tratada como bandida, ela não pode ir para a prisão. Ou pior: morrer. Até quando vamos ignorar que proibir mata mais mulheres?

    Mônica Martelli e Ingrid Guimarães
    (Anna Fischer/Veja Rio)

    Ingrid – Quando Mônica, Heloísa Périssé e eu fazíamos o humorístico Chico Total, havia as gostosas e as comediantes feias. Éramos separadas até por camarim. A Monique Evans e a Gisele Fraga ficavam em um, e a gente em outro. Depois, Mônica e eu fizemos a novela Por Amor, eu era a empregada e ela a secretária. Esses eram os papeis que sobravam para as comediantes naquela época. Hoje, a Tatá Werneck fala palavrão no ar, como um menino, e protagoniza novela. A vida está mais fácil para os novos humoristas. Abrimos muitas portas.

    Mônica – O humor era extremamente machista e racista, as piadas eram todas em cima de negros, nordestinos e mulher gostosa. Eu também não queria me enquadrar naquilo ali, então busquei novos caminhos. Ingrid e eu quebramos estereótipos.

    Ingrid – Mas é verdade que o humor encaretou. A gente tem que pensar em tudo hoje antes de falar para não ser criticada depois.

    Mônica – O mundo caminhou assim e o humor tem que acompanhar. Se a piada incomoda alguém, então não é para fazer. Mas é claro que há o excesso de patrulhamento. Na minha peça, eu pensei duas vezes antes de dizer “se eu não transar com esse homem hoje, ele vai passar os próximos cinco dias sem falar comigo”. Mulher sem transar é sinônimo de marido mal humorado mesmo, gente. Não vou deixar de falar a verdade.

    Ingrid – Vem aí um remake de Os Trapalhões com atores jovens, mas eles não vão mais poder colocar um personagem negro bêbado no ar…

    Mônica – Não dá! Tem outra coisa que me incomoda também: humoristas gordinhas presas aos papeis de gorda. Elas não precisam se limitar, assim como o negro não tem que fazer sempre papel de subalterno. A dramaturgia é um retrato da vida, mas o humor pode transgredi-la um pouco.

    Ingrid – O canal GNT é doido para pôr a gente para fazer algum programa juntas. Uma série, de repente. Estou botando pilha na Mônica para seguirmos a linha de Big Little Lies, da HBO, sobre casamento, maternidade, violência doméstica, assédio, bullying na escola, machismo. Quando terminei de ver, liguei para ela e disse: “Eu sou a personagem da Reese Witherspoon e você é a da Nicole Kidman, que é espancada pelo marido gato”.

    Mônica – Daria um bom filme também, né?

    Ingrid – Sim, total! Vamos fazer?

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