O designer Pedro Lucas Pinho, 30 anos, saiu de Saquarema (RJ) e cruzou o oceano pela primeira vez em 2008. Fazia o Ensino Médio junto com o curso técnico de mecânica quando partiu para um intercâmbio em Taiwan. Fez faculdade de linguística em mandarim e entrou no mercado de exportação da China para o Brasil, como gerente de uma empresa que negociava aviamentos para marcas de luxo em Hangzhou, na China.
Em 2014, tinha uma vida financeira confortável quando decidiu sair daquele meio de empresários e comércio internacional, comprou uma moto e passou a viajar pelo Sudeste asiático fazendo trabalho voluntário.
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“Eu tinha um emprego cobiçado, comandava toda uma empresa intermediária de exportação, fazia meu horário. Eu era bom nisso, nas relações com fábricas e fornecedores, mas tinha um lado que sempre ficava muito inquieto. Comecei a perceber o caminho das coisas”, conta Pedro Lucas.
O designer deu aulas de inglês e trabalhou como voluntário no Skate Park, em Camboja. Dormia em um galpão de madeira junto com os skates e, em uma noite reflexiva, pensou que aquele mesmo galpão poderia ser construído com plástico reciclado. Foi o início do sonho que viraria um projeto futuramente.
Seguiu viagem até o interior de Laos, uma das menores economias do mundo. No pequeno país do Sudeste asiático, o jovem teve o insight de construir sua primeira máquina de reciclagem. Formado em técnico em Mecânica, Pedro Lucas começou suas tentativas para criar uma alternativa às grandes máquinas, complexas e caras, disponíveis no mercado.
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A primeira versão da máquina foi criada com o motor de uma moto usada. Era bem pesada e precisava de mais de uma pessoa para manusear. A segunda versão foi criada em uma escola infantil na ilha de Ko Phayam, na Tailândia. Era mais segura, simplificada e leve. Com os protótipos evoluindo e o dinheiro do trabalho chinês acabando, o brasileiro decidiu voltar às origens e seguir seu sonho na sua cidade natal.
Em dezembro de 2019, voltou a Saquarema para continuar a melhoria de suas máquinas. Criou um financiamento coletivo para custear a montagem. A inauguração desta terceira máquina de reciclagem em pequena escala ocorreu no Festival de Música & Ecologia de Ilha Grande, na Costa Verde fluminense, e atraiu a atenção dos frequentadores do evento, que observavam o plástico sendo reciclado ao vivo. Após alguns alinhamentos, a máquina ainda é utilizada para reciclar e criar barras e placas para futuras construções.
Junto com essa máquina, o projeto que no Camboja parecia uma viagem mental que precedeu uma noite de sono virou realidade. O Projeto Casa Plástica nasceu da ideia de criar uma casa projetada e produzida a partir de plásticos retirados do oceano.
Atualmente, o designer recolhe plástico na praia da Área de Proteção Ambiental de Massambaba, em Saquarema, com intuito de estudar o material deixado na praia. Os materiais recolhidos são separados pela composição. Os plásticos conhecidos como tipo 5 ou PP, de polipropileno, e tipo 2 ou PE, polietileno, são reciclados e transformados em barras e placas para a construção da futura casa. Pedro Lucas estima precisar de 200 placas e 200 barras de plástico, o que daria por volta de uma tonelada de lixo destes tipos retirados da praia.
Os outros materiais recolhidos como recipientes de drogas, cotonetes, preservativos, plásticos menos resistentes, entre outros, são catalogados e levados para a Cooperativa de Catadores e Selecionadores de Materiais Reaproveitáveis do Município de Saquarema (Coresa) ou para um centro de coleta de resíduos de Bacaxá. Para totalizar a tonelada necessária dos tipos 5 e 2 para construção da casa, Pedro Lucas precisa recolher sete toneladas de lixo.
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A coleta seletiva é a realidade mais próxima que a população costuma ter com a reciclagem. O novo sonho de Pedro Lucas é que as pessoas tenham uma recicladora de plástico em casa, como um eletrodoméstico, tornando o consumo mais consciente. Está desenvolvendo o projeto de uma máquina do tamanho de uma cafeteira de cápsula. A ideia é poder viabilizar o produto. “Quero tornar mais possível o reaproveitamento”, sonha.
O Projeto Casa de Plástico também foi um processo. Quando teve seu primeiro insight, no Camboja, imaginou a construção da casa como um projeto pessoal. Após alguns anos criando e melhorando os protótipos das máquinas de reciclagem e diante das dificuldades, o projeto foi sendo ressignificado.
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“De todos os objetos possíveis de serem feitos com plástico reciclado, uma casa tem esse peso universal. O que antes eu imaginava uma coisa para mim começou a tomar essa forma de ser de todos”, explica. “Fazer uma construção que remete a uma casa vai dar a noção que o plástico em si, como recurso, deve ser usado de maneira mais nobre. Não fazer copinho descartável, já que o material dura pra sempre”, completa.
* Lívia Pinheiro, estudante de Jornalismo da PUC-Rio, sob supervisão de professores da universidade e revisão de Veja Rio.