Enquanto alguns bares vêm fechando as portas, outros se ajustam às novas condições sanitárias e resistem. Reformulam cardápios, espaços, capacidades, etiquetas. Buscam se adaptar também às mudanças de comportamento que reconfiguram a vida noturna carioca. O Bar Urca e sua informal extensão – a cultuada mureta à beira-mar – passaram a receber um movimento mais disperso e “conscientizado”, conta o gerente, Eriksson Silles Silva: “As atitudes de todos mudaram muito. Hoje vejo pessoas se tratando com mais respeito, cuidado, e trocando mais informações. A frequência diminuiu, mas a conscientização aumentou. Acredito que possamos voltar ao novo normal com mais respeito e amor ao próximo”.
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Famoso por concentrar muita gente, sobretudo nos fins das tardes de sol e à noite, aquele cantinho da Urca não recebe mais um grande fluxo de pessoas, tampouco conserva horários de pico. A frequência se espalha ao longo do dia e se espalha entre si, conforme o distanciamento exigido para conter a propagação do coronavírus. (Noutros cantos não se observa, infelizmente, o mesmo cuidado.)
A frequência mais contida, afastada e esparsa é a realidade vivenciada por bares e restaurantes desde a reabertura, em julho. Uma realidade que, diante do repique de contágios e mortes por Covid-19 no Rio, deve se prolongar ainda por meses.
Em meio às adaptações e provações impostas pela pandemia, algumas casas têm ficado pelo caminho e deixado órfãos habituais frequentadores. Dos cerca de 10 mil estabelecimentos da capital fluminense, mil já fecharam as portas – provisoriamente ou definitivamente –, a maioria deles na região central (40% dos localizados naquela área deixaram de funcionar neste ano, calcula o Sindicato de Bares e Restaurantes do Rio). Outros provavelmente terão de fazer o mesmo.
Aos impactos econômicos, somam-se perdas sociais e culturais. Assim retrata, por exemplo, o apagar da Casa Villarino, no Centro, cujas paredes ajudam a contar a história do Rio desde a segunda metade do século passado. Lá Tom Jobim e Vinicius de Moraes se encontravam, em 1956, para compor “Orfeu da Conceição”. A mesa da dupla era preservada como atração até o mês passado, quando o bar fechou as portas por tempo indeterminado.
Nos 67 anos de vida, a Casa Villarino notabilizou-se como reduto de intelectuais, artistas e figuras importantes da sociedade carioca. Viu a bossa nova nascer e crescer. No ano passado, foi cenário para o curta “Eurpoa”, dirigido por Edson Celulari. Um dos participantes da produção, Franco Salvoni descreveu o ambiente como “muito aconchegante e receptivo”. A esperança de a cidade reavê-lo está depositada na vacinação: os gestores da Casa Villarino pretendem reabri-la depois da imunização e a retomada integral da vida noturna.
Enquanto este sonhado dia não chega, alguns bares buscam já reencontram algo próximo da normalidade. O gerente do Jobi Antônio Marques Pires, relata que “o horário de pico voltou a fazer parte da rotina”. Aberto das 11 da manhã às duas da madrugada, o bar do Leblon trocou a tradicional aglomeração extensiva à calçada por regras de distanciamento. “Os clientes se mostram mais preocupados, mais atentos e exigentes com as medidas de proteção “, constata Antônio.
Uma parte desses comportamentos e exigências tende a continuar mesmo com o fim da pandemia, avaliam profissionais da área e consumidores. As novas medidas de proteção têm despertado a busca por pontos mais adaptados às condições exigidas pela crise sanitária sem precedentes. Ambientes abertos tornam-se mais procurados do que lugares fechados, sem contar o crescimento do delivery de inúmeros restaurantes.
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Embora o uso de máscaras tenha se incorporado à rotina de bares, como determina a Lei 13.979/20, muitos ainda resistem a adotar esta e outras medidas igualmente importantes para conter a contaminação, como a distância social de dois metros, no mínimo. A displicência não se concentra numa área. É observada na noite do Baixo Botafogo, Baixo Leblon, de outros trechos da Zona Sul, da Barra, do subúrbio.
Para manterem os bares alinhados às exigências da Vigilância Sanitária, e evitarem o risco de serem advertidos, multados ou até fechados, garçons ou gerentes precisam sistematicamente pedir a clientes que (re)coloquem a máscara. Um contraste em relação a funcionários, que se mostram, em geral, bem adaptados à proteção desde o início da flexibilização.
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Bares e restaurantes que cumprem as novas regras sanitárias recebem o Selo de Conformidade com as Medidas Preventivas da Covid-19 (Xô Corona). As medidas envolvem também a disponibilidade de álcool 70%, dispositivos de sabão líquido, papel-toalha, lixeiras sem abertura manual e o uso de máscara em todos os ambientes. Várias delas provavelmente permanecerão na vida dos cariocas.
*Por Luisa Esperon, Maria Carolina Insua e Maria Mariana Braga, alunas de Comunicação Social da PUC – RJ