A obesidade e coronavírus são uma combinação gravíssima. Não à toa, diversos estudos recém-publicados demonstram que o excesso de peso e a idade avançada são os maiores fatores de risco para que os pacientes desenvolvam a Covid-19 (do inglês, Coronavirus Disease 2019). Em todo este cenário, digamos catastrófico, há um agravante: a obesidade é também o maior fator de risco, de gravidade e mortalidade nos pacientes abaixo dos 60 anos.
Por que precisamos entender isso? Estamos vivenciando uma pandemia de um vírus, ainda muito desconhecido pela ciência e pela medicina, mas que, por outro lado, traz uma oportunidade de jogarmos luz e descortinar ideias positivas que possam ajudar em seu enfrentamento e, em dada medida, na prevenção contra ele. A batalha contra o novo coronavírus nos dá a possibilidade de tentarmos nos precaver de doenças como o câncer, diabetes, obesidade, hipertensão, demência e AVC, outras epidemias contemporâneas.
Isso posto, vamos começar por onde toda esta história se inicia: a boca e o nariz. A porta de entrada do coronavírus é o mesmo abre-alas de uma simples solução, por vezes menosprezada pela população: aquilo que colocamos boca adentro, estimulados pelo nosso olfato e nossa visão, em outras palavras, a popular dieta.
Para combater esta – e outras futuras pandemias – precisamos ir além do discurso da importância do uso massivo das máscaras que passam por nossa boca. É preciso falar da comida que entra nela. É claro que, para fazer frente ao tratamento das doenças anteriormente citadas, medicação e cirurgias bariátricas, por exemplo, podem ser recursos coadjuvantes e adotados, desde que com prescrição de um profissional sério. Mas a origem desses males – e o cerne da questão – está relacionada à nossa dieta. Eis a razão pela qual precisamos associar as soluções à melhora daquilo que comemos no nosso dia a dia.
Uma boa notícia: mudanças na dieta podem, rapidamente (leia-se em questões de semanas), melhorar e em alguns casos até reverter algumas destas doenças crônicas, como a diabetes tipo 2. A chamada dieta low carb (reduzida em carboidratos) vem demonstrando resultados muito interessantes nesse sentido. Um estudo controlado, realizado na Universidade de Indiana, com 262 adultos portadores de diabetes tipo 2 demonstrou que, em apenas dez semanas, 56% dos pacientes que seguiram esse tipo de regime conseguiram contorná-la. Acompanhada por dois anos após os resultados do estudo, metade da população nele envolvida manteve-se livre do diagnóstico da diabetes tipo 2 (aquela adquirida ao longo do tempo, com origem na resistência à insulina, hormônio que ajuda a injetar glicose para o interior das células). (1).*
Outras pesquisaram apontaram que a dieta low carb pode melhorar rapidamente e substancialmente vários fatores de risco cardiovascular, a exemplo da hipertensão arterial, um dos principais fatores de risco para o agravamento dos pacientes com Covid-19. Um estudo de 2011 publicado pela revista Obesity, com 300 pacientes que fizeram uma dieta baixa em carboidratos (low carb), concluiu uma redução rápida e sustentada da pressão arterial (2)*.
Diversos estudos clínicos de qualidade e significância estatística também já comprovaram a eficácia da redução da ingestão de carboidratos como uma estratégia segura na luta contra a obesidade, o maior fator de risco para o novo coronavírus em pacientes jovens, conforme dito lá em cima. Um ensaio de 2014 com 148 indivíduos, realizado nos Estados Unidos, e financiado pelo National Institutes of Health, demonstrou, no fim do primeiro ano do estudo, que uma dieta à base de poucos carboidratos é “mais eficaz para a perda de peso e para a redução dos fatores de risco cardiovasculares” do que uma dieta reduzida em gorduras (low fat) (3)*.
Desde 2018, a Associação Americana de Diabetes (ADA), assim como a europeia, consideram a dieta reduzida low carb uma possibilidade terapêutica nutricional em pacientes com diabetes tipo 2, em boa parte porque a dieta pode reduzir a pressão arterial e melhorar o HDL, o colesterol “bom”(4)*.
Segundo um relatório da própria ADA de 2019, uma dieta reduzida em carboidratos “demonstrou mais evidências em relação à melhora da glicemia dos pacientes com diabetes tipo 2”, ou seja, a adoção de uma dieta sem uso de qualquer medicamento pode mitigar os níveis de glicose no sangue destes pacientes, algo fundamental para evitar os piores quadros da COVID-19 (5)*. Em outras palavras, quanto mais controlado estiver o pacientes com diabetes, ou seja quanto melhor o seu controle glicêmico, menos riscos de gravidade este paciente pode ter caso venha ter o novo coronavirus.
Tomemos como exemplo a China, epicentro inicial da pandemia. Por lá, um estudo recém-publicado na revista Cell Metabolism, feito com 7337 pacientes chineses diagnosticados com Covid-19, demonstrou que os pacientes com diabetes tipo 2 que apresentaram um bom controle glicêmico, ou seja, um bom controle da sua diabetes, tiveram “uma mortalidade substancialmente menor” quando comparados àqueles portadores que negligenciaram o controle da doença. (6)* (7)*
Sem dúvida, as melhores soluções para prevenção e para o tratamento das doenças crônica começa pelos alimentos que compõem a nossa dieta. Não vem sendo, portanto, diferente com o coronavírus, uma vez que tudo o que puder ser feito para tratar a obesidade e suas comorbidades será sempre bem-vindo e, como já se sabe, tem efeitos positivos contra a Covid-19.
Entender e, sobretudo, ter controle sobre o que você come é ter autoridade com relação à sua própria saúde. É pôr em prática o que Hipócrates, o “pai ” da medicina, sabiamente preconizou: “Que seu remédio seja seu alimento e que seu alimento seja seu remédio”.
Referências Biobliográficas:
1. A Novel Intervention Including Individualized Nutritional Recommendations Reduces Hemoglobin A1c Level, Medication Use, and Weight in Type 2 Diabetes
2. It is time to stop counting calories, and time instead to promote dietary changes that substantially and rapidly reduce cardiovascular morbidity and mortality
3. Effects of Low-Carbohydrate and Low-Fat Diets – A Randomized Trial
4 e 5. Management of Hyperglycemia in Type 2 Diabetes, 2018. A Consensus Report by the American Diabetes Association (ADA) and the European Association for the Study of Diabetes (EASD)
6. Association of Blood Glucose Control and Outcomes in Patients with COVID-19 and Pre-existing Type 2 Diabetes
7. A Low-Carb Strategy for Fighting the Pandemic’s Toll