Por Marcelo Copello
Podemos distinguir gosto pessoal de qualidade? A meu ver sim, eu mesmo admito gostar de vinhos nos quais não vejo tanta qualidade sob o ponto de vista técnico, e vice-versa, comprovo qualidade técnica em vinhos que pessoalmente não me agradam muito. Podemos isolar o aspecto pessoal/cultural em uma degustação e nos concentrarmos apenas no lado técnico/sensorial? Podemos nos aproximar bastante disso nas degustações às cegas, onde não sabemos nada a respeito do vinho. Nas linhas que se seguem vamos articular e refletir juntos sobre os temas gosto, qualidade, sensações e cultura. (Veja uma lista de vinhos avaliados www.marcelocopello.com/vinhos)
Gosto pessoal
O que define seu gosto pessoal? Gostou ou não gosto? Sim, você não precisa nos explicar porque gosta de um vinho. Seu gosto traz sua, e só sua, história. Nela suas experiências pessoais tem mais peso que a opinião de qualquer especialista. O que você gostava quando criança, o que se comia e bebia nos lugares onde você viveu ou que visitou, uma experiencia ruim com algum alimento ou bebida, momentos marcantes de sua vida que deixarem um sabor em sua memória. Tudo isso pesa.
Qualidade à luz da ténica
O que define qualidade em um vinho? Sob o ponto de vista dos críticos, qualidade se define por padrões internacionalmente aceitos. Embora o método e a opinião possa variar bastante de crítico para críticos, todos partem de pontos semelhantes. Refiro-me a formas de julgar como o vinho se comporta diante de nossos sentidos, olhos, nariz e boca. Usamos critérios como intensidade aromática (impacto no nariz), concentração de sabores (ou volume de boca), profundidade (camadas de sabores), complexidade (variedade/riqueza de aromas/sabores), tipicidade (se o vinho é coerente com sua origem), persistência (tempo que os aromas/sabores ficam em nosso nariz/boca), equilíbrio e integração entre seus elementos, longevidade (potencial de guarda) e finesse (ou fineza, algo bem difícil de colcar em palavras, o oposto de rusticidade). Só é possível uma abordagem francamente sensorial em degustações às cegas.
Sensorial ou Cultural?
Podemos apreciar um vinho de incontáveis maneiras, com incontáveis métodos e visões, ou mesmo sem nenhum método, caso se queira. Gosto, contudo, de lembrar que duas aborgadens principais são a sensorial e a cultural (ou afetiva, como está na moda dizer). Na primeira, mais usada nos meios profissionais ou academicos, observamos o vinho quanto a suas cores, aromas, gostos e texturas. Isolamos o vinho de seu contexto e mergulhamos hedonisticamente (ou cartesianamente) no líquido que está na taça. Só é possível uma abordagem 100% sensorial em degustações às cegas.
Degustamos afeto?
Na abordagem cultural/afetiva, o vinho traz toda sua bagagem histórica. Aqui tudo conta: a beleza da garrafa e rótulo, o nome, o preço, a origem, a opinião de outras pessoas sobre o vinho, onde e de quem você o comprou, como o conheceu, em que ocasião, local ou companhia que a garrafa foi aberta. Qualquer particularidade ou curiosidade fará diferença. Absolutamente qualquer informação sobre o vinho pode pesar no que acharemos dele.
Você comprou a garrafa em uma maravilhosa viagem de férias? Você estava naqueles dias de amargo mal humor quando o provou? O vinho é uma raridade, caríssimo e famoso? A safra é de seu ano de nascimento? Alguém de bom gosto em quem você confia elogiou o vinho? O vinho tem uma história comovente? Quem lhe deu o vinho é alguém que você detesta? Tudo isso pesa, talvez até mais que o gosto do vinho.
Quando você prova um vinho sabendo que vinho é, absolutamente tudo no vinho (e em você) influenciará sua opinião final.
Logo, o que forma sua opinião sobre a qualidade de um vinho? O seu “gostei/não gostei”? Uma mistura de seu gosto pessoal (sua história), a história do vinho, a sua história com o vinho (o contexto em que você conheceu, degustou etc) e finalmente, sua apreciação sensorial.
Como costumo dizer, há mais coisas entre a língua e o céu da boca com que ousa sonhar nossa vã enogastronomia.
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