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Liberados pela Prefeitura, Food Trucks ganham o Rio

Depois de fazerem sucesso nas feirinhas e nos eventos gastronômicos, os caminhões vão para as ruas da cidade 

Por Carla Knoplech e Rafael Cavalieri
Atualizado em 2 jun 2017, 12h27 - Publicado em 19 set 2015, 01h00
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  • Há exatamente um ano, os cariocas tiveram o primeiro contato com uma novidade do universo gastronômico que vinha fazendo enorme sucesso em outras metrópoles, como Nova York, Toronto e Los Angeles. Tratava-se dos food trucks, pequenos caminhões onde se prepara e vende comida variada, que por aqui estreavam em um evento realizado nos jardins do Planetário, na Gávea. A expectativa era que a feirinha de trailers recebesse 1 000 pessoas, mas, para surpresa geral dos organizadores, o público que compareceu foi dez vezes maior que o esperado, o que provou que o Rio também tinha vocação para essa nova versão da culinária ambulante. Desde então, o fenômeno só ganhou força, os caminhõezinhos se multiplicaram e agora, oficialmente legalizados, podem sair às ruas da cidade. Nas últimas semanas, 38 unidades foram habilitadas pela prefeitura para ocupar os 83 pontos do Centro e das zonas Norte, Sul e Oeste. Destas, onze já receberam o alvará definitivo, que autoriza o estacionamento junto às calçadas e a comercialização de seus quitutes. “A regulamentação é uma boa notícia, pois permite que a novidade seja um ganho para a sociedade e não crie transtornos, como concorrência desleal e desorganização no trânsito”, avalia a chef Roberta Sudbrack, dona de um desses veículos, um reluzente Mer­ce­des-Benz avaliado em 300 000 reais e batizado de SudTruck. Em eventos fechados, ela já vendeu, em um único dia, mais de 2 000 de seus hot-dogs de luxo, a 20 reais cada um. Aprovada na etapa inicial do processo e com pontos definidos em Laranjeiras e na Barra, ela aguarda para os próximos dias a emissão do certificado que permite a venda de sanduíches na rua.

    Paris Gourmet
    Paris Gourmet ()

    Vencedora de sete prêmios do especial Comer & Beber de VEJA RIO e eleita a melhor chef da América Latina pela revista inglesa Restaurant, Roberta reflete o impacto do fenômeno dos food trucks no setor de gastronomia carioca. A rede Gula Gula, com dezessete unidades, tem seu próprio veículo para vender as comidinhas. O tradicional Mosteiro, instalado há 51 anos na Rua São Bento, criou o Mosteirinho para levar suas especialidades portuguesas a bairros como Tijuca, Botafogo, Largo do Machado e Leblon. O motivo para tanto interesse é simples: as caminhonetes e os trailers adaptados têm se revelado um negócio promissor. Em alguns casos, chegam a lucrar mais que as casas que os originaram. É o caso do Ribz, um filhote especializado em pratos de costela do bar Botero, localizado em Laranjeiras. Em funcionamento há menos de seis meses, o trailer custou 80 000 reais e tem cumprido uma rotina nas feirinhas do gênero antes de ganhar as ruas, o que deve acontecer em breve. Nos meses mais movimentados, já chegou a faturar 90 000 reais (valor igual ao que o bar costuma embolsar no mesmo perío­do). Enquanto na matriz a margem de lucro é de 15%, na unidade itinerante pode atingir 30%, dependendo do evento. “Esse mercado está em plena expansão na cidade”, comenta o chef Bruno Magalhães, sócio dos dois negócios. Não à toa, nos estudos feitos pela prefeitura para estabelecer a localização dos veículos, levou-se em consideração o possível impacto nos estabelecimentos já existentes nos arredores, em um momento de retração econômica. “Estamos apostando em áreas que não estão consolidadas, para que os comerciantes comecem a formar sua clientela. Seria uma disputa desleal colocar um food truck em frente a um restaurante que batalhou tantos anos para construir aquele ponto”, explica Antonio Pedro Figueira de Mello, secretário de Turismo do órgão responsável pelas licenças junto com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária e a Secretaria de Ordem Pública.

    Planetaria
    Planetaria ()
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    Com um investimento inicial relativamente baixo em comparação ao da instalação de um ponto fixo, os food trucks atraem empreendedores dispostos a se lançar na atividade gastronômica, mas que não têm capital suficiente para arcar com o alto valor das luvas de um ponto comercial e do aluguel. Para virar um restaurante itinerante, é preciso pagar, além da importância para a aquisição do veículo e dos impostos sobre a venda, uma taxa de 680 reais mensais à prefeitura. Apostando nisso, o casal francês Loïc Soares e Anne Auxensans lançou o Paris Gourmet, em março deste ano, com um aporte de 250 000 reais na empreitada, consumidos basicamente na compra do automóvel. Desde a semana passada, o casal tem autorização para estacionar em pontos da Barra, Botafogo, Leblon, Catete, Centro, Laranjeiras e Recreio. Há um ano e meio no Brasil, o publicitário e a cozinheira deixaram a França após se desfazerem do apartamento e do carro e juntarem todas as suas economias. Agora, comercializam quitutes salgados e doces com acento francês. “Os trucks começaram em Paris há uns cinco anos, mas a cultura da cidade é bem diferente. Ao contrário dos franceses, os cariocas não se incomodam em comer na calçada, e isso é fundamental para o sucesso do negócio”, conta Loïc. “Outra vantagem é o clima. Lá só é possível trabalhar seis meses por ano, porque o inverno é muito rigoroso. Aqui o negócio dura o ano todo.”

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    Ao chegarem às ruas, os donos de food truck encontram um ambiente de negócio bem diferente do frisson das feiras em espaços fechados, um sucesso que se multiplica pela cidade e já extrapolou a capital. Enquanto nesse tipo de evento recebem fãs ardorosos dispostos a encarar longas filas para comprar um sanduíche ou pratinho de risoto ou massas, nas ruas terão de atrair os clientes habituados a outras opções de alimentação. “O primeiro dia de operação em Copacabana foi muito confuso; vendi apenas dez cachorros-quentes”, diz João Pedro Borges, dono do Dogaria, que enfrentou problemas como a falta de vagas de estacionamento na área destinada ao seu caminhão. “Nos outros dias, na Praça Saens Peña, melhorou um pouco o movimento, mas é preciso um uso pesado das redes sociais na internet para chamar a freguesia para os pontos”, explica. Na Barra, foi por acaso que o administrador de empresas André Luis Bonilha e a economista Mainni Dias depararam com o Paris Gourmet. Eles aproveitaram para provar (e aprovar) os sanduíches: “Os preços dos restaurantes andam abusivos, e os trucks são uma boa alternativa. Claro que não se trata de uma opção baratinha, mas é uma comida de qualidade a um valor bem mais acessível”, diz Mainni.

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    Com pratos parecidos com os das lanchonetes e restaurantes de comida rápida, os food trucks são uma versão glamorizada dos velhos pontos de venda de comida de rua que desde os tempos coloniais existem na cidade. “No século XVIII, já tínhamos relatos sobre as famosas quitandeiras, que vendiam todo tipo de produto alimentar e também um famoso angu”, recorda o historiador Nireu Cavalcanti. “A grande diferença é que agora ficou charmoso comer na calçada. Antes, era coisa do povão”, explica. Os cardápios refletem a proposta mais refinada desses microrrestaurantes móveis. No Ribz Truck, por exemplo, o arroz de costela é servido com paio crocante. Da cozinha do Paris Gourmet saem almôndegas com ratatouille, guarnição com legumes típica da França, e o Rio Food Truck Bar, do chef Maurício Furtado, serve risoto de gorgonzola com castanha-do-pará. Em média, os pratos custam de 20 a 30 reais. “Não fazemos cachorro-quente de 5 reais, não usamos salsichas industrializadas. Há quem reclame dos preços, mas nosso produto é diferente”, diz Furtado. A experiência internacional mostra que o novo filão gastronômico se incorporou à vida e à economia das grandes metrópoles. Estima-se que existam mais de 8 000 food trucks em serviço só em Nova York. E, pelos cálculos do setor nos Estados Unidos, as cozinhas sobre rodas movimentam 860 milhões de dólares por ano no país. Um número alentador para os aventureiros que se dispõem a desbravar esse tipo de atividade por aqui.

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